segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

CASA DEL AMOR.

En la casa del amor, corazón
Han vivido sensaciones extrañas
E tan diferentes que ha partido
El cuerpo en dos seres.

Cada uno se exilias en su cuarto
En la casa del amor, corazón
Haciéndome solo en mi propio ser.

En la noche es más espinoso
Caminar, hace oscuridad,
Mis ojos sieguen disolutos,
Sin rumbo cierto los pasos…

Así tengo recelo de hundir
Na penumbra de la alma
Y morir de desolación
Sin su amor…

28 de diciembre de 2008, 19h
Robério Pereira Barreto

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

FELICITAÇÕES NATALINAS

Caros webloggers,

Quero agradecê-los pelos acessos a este nosso espaço, bem como as leituras feitas e comentários aos textos aqui postados. Aproveito a oportunidade para reafirmar o propósito desse diário eletrônico dizendo: Aqui são postados poemas, idéias, ensaios e artigos que considero na minha ainda incipiente trajetória de pensador, singelas contribuições para a reflexão sobre o fazer cotidiano dos estudantes e profissionais da linguagem que buscam interação com o mundo e as realidades pensadas a partir dos uso das linguagens, as quais têm nas tecnologias intelectuais (escrita, internet, rádio, televisão, etc.) espaço de mediação tecnopedagógica. Ainda nesse espírito de confraternização, desejos a todos que visitam esse espaço um FELIZ NATAL e, que, em 2009, todos os sonhos sejam realizados, fazendo-nos cada vez mais pessoas humanas e felizes de acordo com aquilo que somos e temos.
FELIZ NATAL
NATAL FELIZ
É ENCONTRAR EM NÓS MESMOS
O ESPÍRITO DA PAZ E A ALEGRIA
DE VIVER EM HARMONIA
COM OS IGUAIS E DIFERENTES.

IRA

Chegou à casa da alma
E não a tenho...
O coração não disfarça...
Disparando pulsar galopante
Desperta a ira da alma.

Angustiada a alma
Reclama tamanha ilusão
Por que não achar isso
Simples capricho
OU
Ira do malvado destino
Que faz desse amor;
Ínfima chama?

Qualquer seja não tens
O direito de apagá-la
Num simples vento;
Aceno e do adeus!

19 de dezembro de 2008. 14h51min
Robério Pereira Barreto

sábado, 29 de novembro de 2008

DESCONFIANÇA

Há na alma a dor e a angustia
Que espreitam o peito
Como a ave de rapina
Vigia sua presa por entre
As frestas dos galhos.

Oh tempo, tu que sois
Demiurgo do mundo
E agora é nosso aliado e algoz.

Na hora certa falará por nós
E, Quiçá na sua sentença
Defenda-nos e nos faça
Alma una.

29 de novembro de 2008, 23h04min.
Robério Pereira Barreto

CAIXA DO TEMPO

A cada morte da noite
Nasce uma manhã
Que também pouco
Viverá entre a dúvida
Do amor e da dor do medo.

Nesse lapso de tempo
Vivemos entre o tempo
De ter medo e o desejo de amar
Como se ao final de cada hora
Tudo fosse terminar.

Emergente, a alma se lança
Ao mundo dos sonhos a recuperar
O tempo na gangorra: amor e medo...

29 de novembro de 2008, 21h37min
Robério Pereira Barreto

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

A DOCILIZAÇÃO DO CORPO FEMININO EM TERRA FRIA, DE NIKI CARO

A DOCILIZAÇÃO DO CORPO FEMININO EM TERRA FRIA, DE NIKI CARO
Robério Pereira Barreto*


RESUMO: Este texto faz a discussão sobre a não violência contra a mulher, promovida da Universidade do Estado da Bahia – UNEB – em todos os seus campi, tendo sido intitulado 16 de dia da não violência contra a mulher. Nesse sentido, recortou-se como tese o processo de docilização do corpo feminino no social. Para tanto, teve como corpus a narrativa fílmica Terra fria (2005), de Niki Caro. Que tem como protagonista Josey Aimes a qual é agredida em casa pelo marido e mais tarde, ela passa a ser discriminada e sofre assédio sexual dos colegas de trabalho na mina onde consegue emprego. Caro capta esse ponto de maneira eficiente ao mostrar parte do rito de iniciação por que passa Josey, isto é, ela tem seu corpo invadido simbolicamente no ato da admissão – passa por exame ginecológico. Mais tarde, Para reaver os direitos ignorados pelos integrantes do quadro de funcionários da mina, ela vai à procura a Justiça.

Palavras-chave: Assédio sexual; Docilização do corpo; Violência; Mulher.


Este texto faz a discussão do processo de docilização do corpo feminino no social. Isso há muito é presente na cultura humana e, que a mulher é um ser inferior e, portanto, deve ser submetida às vontades dos homens que fazem parte de suas vidas – pai, irmão, filho, professor, chefe, etc. Para se verificar isso se toma como recorte à narrativa filmica Terra fria (2005), de Niki Caro. Para tanto se usam como fundamentação teórico-metodológica os estudos pós-estruturalistas de Michael Foucault (1999) e Irving Goffman (2005). Por se tratar de uma temática de caráter socialmente relevante.
Entretanto, esclarece-se a priori que e, até por força de formação acadêmica; não se pode considerar esse estudo como um olha jurídico ou algo assim. Ao contrário, trata-se, na verdade, de uma análise sobre o discurso e o contexto em que se realizam as cenas do filme. Por outro lado, busca-se fazer uma relação com os acontecimentos e realidades noticiadas pela mídia local e nacional, no que se refere à violência empregada contra as mulheres na sociedade atual.
Com efeito, a docilização do corpo social, sobretudo, do corpo feminino é fruto de uma cultura que advém de tempos remotos e, inclusive, há registros na Bíblia que dão a seus exegetas a condição de tratar a mulher como meros receptáculos de suas necessidades, gerando assim, as condições ideais para que elas [mulheres] sejam profanadas em seus direitos civis e individuais.
Em Terra fria, Niki Caro mostra de maneira significativa por meio de uma adaptação de acontecimento real, ocorrido no tribunal de Minissota, EUA, em 1998, aquilo que Foucault considera a mudança de comportamento do corpo social e individual. “O suplício tornou-se rapidamente intolerável. Revoltante, visto da perspectiva do povo, onde ele revela a tirania, o excesso, à sede de vingança e o cruel prazer de punir” (FOUCAULT, 1987, p. 69).
Dessa forma, ver-se que essa questão são resquícios de uma sociedade em que os conceitos de masculinidade sobrepõem a vontades e direitos femininos, deixando a mulher ainda em desvantagens com relação aos lugares sociais de fala e produção com relação homem. Tem-se, prova disso, a demora em se criar uma legislação adequada para atender a esses casos. Somente em agosto de 2006, o Governo federal sancionou a norma que criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, a Lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha.
O preconceito e a imposição dos direitos exclusivamente masculinos ainda são presentes até nas sociedades que declaram ser democráticas. O filme Terra Fria, da diretora Niki Caro, mostra como, nos Estados Unidos da década de 80, as mulheres ainda não tinham seus direitos igualmente respeitados pelos homens. Na história, Josey Aimes sai de casa por causa das agressões do marido e volta para sua cidade natal para morar com os pais. (A novela A Favorita – Rede Globo – retratada por meio da personagem Catarina, obscuridade das agressões físicas e psicológicas promovida por maridos e companheiros de trabalho às mulheres, através da figura dramática do marido Catarina; violento e canalha, Leo).
No caso de Josey Aimes, no entanto, seu pai não concorda com a decisão da filha e a acusa de ser a culpada pelo fim do casamento ao ver as marcas de agressão no seu rosto, mantém-se a favor do agressor, pois acredita que Aimes traiu o marido e, portanto, mereceu tal “correção”. Além disso, Hank ver na filhas e netos aumenta as despesas domésticas.
O filme, que, em sua maioria, apresenta uma narrativa não linear, começa com cenas de Josey arrumando suas coisas e as de seus dois filhos para abandonar a casa. A seqüência é montada com cenas em que a personagem principal apanha. Em nenhum momento, mostra-se o agressor, que de certa forma é uma maneira de retratar a realidade, uma vez que a maioria dos casos de agressão e assédio sexual os agressões submetem às vítimas a pressões psicológicas paralisantes, de modo que algumas adquirirem a síndrome de Stocolmo – que segundo especialistas é quando a vítima sofre tanto na mão do algoz que acaba se apegando a ele. No caso da narrativa de Niki Caro, a violência domiciliar é subentendida pelo cenário do crime, cozinha de uma casa destruída, indicando que houve lutar e agressão ali.
Em seguida, ver-se Josey sair correndo de sua residência com os dois filhos: uma menina de aparentando 8 anos, e um adolescente de 14 anos. Eles pegam o carro e vão para a estrada em busca da cidade natal de Josey, no norte do estado de Minnesota (EUA). Interessante é notar que, na recepção familiar, os três são bem recebidos pela mãe da protagonista. Entretanto o pai não concorda com a mudança da família. Ao ver que Josey tinha marcas de agressão no rosto, conclui que ela tinha traído ou feito algo contra o marido e que, merecidamente, havia apanhado. A protagonista promete que não ficará na casa dos pais e que, por conseguinte, não trará despesas. Ela afirma que quer arrumar um emprego. O pai não acredita que ela vá conseguir. Porque talvez por ele faça parte e conheça os ritos de iniciação pelos quais as mulheres passam. O que de acordo com Goffman (2007) é normal em instituições, mesmo que não sejam consideradas totais, mas são dominadas por um grupo cujo poder é mantido pela força. Nesse caso, a mina é dominada pela perspectiva de poder dos homens que, seguindo seus instintos disputam o lugar à força. E, portanto, ver na mulher uma ameaça tanto seus postos de trabalho quanto à legitimidade de sua força.
Josey, aconselhada por uma amiga, arruma um emprego em uma mineradora, onde a maioria dos funcionários são homens. Lá, ela passa a ser discriminada e sofre assédio sexual dos colegas. Segundo Goffman (2007, p. 49) “a tensão psicológica frequentemente criada por ataques ao eu pode também ser provocada por questões não-percebidas como ligadas aos territórios do eu [...]” levando o indivíduo à aceitação de princípios que levam à docilização do seu eu e corpo devido a uma necessidade individual o coletiva.
Caro capta esse ponto de maneira eficiente ao mostrar parte do rito de iniciação por que passa Josey, isto é, Josey tem seu corpo invadido simbolicamente no ato da admissão. É submetida a exame genicológicos e, em seguida, é alvo de comentários infames por parte do chefe quando este diz que o médico lhe afirmou que, Josey é muito bonita nua.
Tratando da problemática que envolve o ingresso dos indivíduos em instituições totais, Goffman corrobora dizendo que: “Os processo de admissão, que tiram do novato os seus apoios anteriores, podem ser visto como a forma de a instituição prepará-lo para começar a viver de acordo com as regras da casa” (GOFFMAN, 2007, p. 50).
Para reaver os direitos ignorados pelos integrantes do quadro de funcionários da mina, ela vai à procura a Justiça. Porém, essa ação é vistos pelos colegas como uma afronta e por isso passam a ameaça e física e psicologicamente.
Ao chegar ao local, ela e outras mulheres escolhidas no processo seletivo são apresentadas ao trabalho e vão conhecer a mina. Ao voltarem ao vestiário, têm as primeiras provas do preconceito e da agressão moral: os homens picham xingamentos nas paredes do local.
Nesse sentido Goffman (2007) afirma que: “os castigos e privilégios são modos de organização peculiares às instituições totais. Qualquer que seja a sua severidade, os castigos são em grande parte conhecidos, no mundo externo do internado, como algo aplicado a animais e crianças;” (GOFFMANN, 2007, p. 51). Durante os dias, ela e as colegas são motivos de brincadeiras de mau gosto e assédio sexual dos colegas. Josey passa a ser alvo dos ataques de um ex-namorado, que faz questão de lhe “passar cantadas” e chamá-la de nomes de baixo calão.
Ela reclama com o chefe do departamento, mas ele diz que ela é quem está no lugar errado e, que se quiser permanecer no emprego tem que aceitar o que os outros fazem com ela. A personagem principal do filme tenta mobilizar as colegas para evitar novas agressões. No entanto, elas demonstram que são conformadas com a situação e que não acreditam que as coisas possam ser mudadas.

O corpo, do qual se requer que seja dócil até em suas mínimas operações, opõe e mostra as condições de funcionamento próprias a um organismo. O poder disciplinar tem por correlato uma individualidade não só analítica e celular, mas também natural e orgânica.” (FOUCAULT, 1987, p. 141).

Além de enfrentar problemas no trabalho, Josey ainda é obrigada a encarar o preconceito tanto do pai quanto do filho dentro de casa. No desencadear da história, descobre se que o menino, Sammy, não é fruto do relacionamento dela com o ex-marido. Em cenas de flashback, apresentam-se imagens de Hank conversando com Josey ainda adolescente e a garota afirmando estar grávida e não saber quem é o pai. Em outras cenas, personagens secundários fazem comentários sobre a fama de Josey quando era mais nova, falando que ela teria tido relacionamentos com diversos homens. O ápice dos problemas familiares de Josey acontece durante uma partida de hokey da qual Sammy participava.
Não obstante de o garoto ser um bom jogador, os colegas de time dizem que não fariam com que Sammy participasse das jogadas devido à fama ruim da mãe dele. Durante o intervalo do jogo, ela e um amigo vão comprar um lanche. Neste momento, Josey escuta alguém chamando seu nome. Uma mulher que se identifica como esposa de um dos mineradores a xinga e afirma que Josey se insinua para os homens com quem trabalha. Todas as pessoas que estão no ginásio escutam a discussão, inclusive Sammy. Ao terminar a partida, o garoto pede para que sua namorada avise Josey que ele não voltaria para casa. Desesperada, a mãe arranca o filho à força do carro da namorada. É neste momento que ela se dá conta de que o preconceito e a violência não estão somente em seu ambiente de trabalho. Ela percebe que não consegue respaldo nem nos homens de uma nova geração, que é o caso do filho, nem mesmo nas colegas que se conformam com a realidade vivida por muitas mulheres da cidade.
No entanto, surge a partir daí, um contraponto. Bill White é um amigo de Glory e seu marido e aparece em cena pouco antes do desenvolvimento das confusões vividas por Josye. Mas é no instante da briga com seu filho que ele ganha importância na seqüência cinematográfica. Bill é um advogado e ex-jogador de hokey conhecido na cidade. Ele se torna o ponto de apoio da protagonista e é a prova de que nem todos os homens a tratariam mal e que ela poderia contar com a Justiça para reaver seus direitos.
No início do filme, Josey está em uma lanchonete com os filhos quando é reconhecida pelo dono da mina. O homem se apresenta a ela e diz que, quando precisar, pode procurá-lo. Após observar o comportamento dos colegas de trabalho, ela decide marcar uma reunião com o proprietário da mina para contar-lhe o que acontece lá. No entanto, ao chegar ao escritório é surpreendida com a presença do chefe de departamento na sala da diretoria.
Durante a conversa, os dois falam que ela quer assinar a demissão. Ao negar o fato, a mulher é acusada de subverter os colegas. Os dois dizem que ela só permanecerá no emprego se passar a se comportar.
Josey volta para sua cidade e procura Bill pedindo para que ele a represente judicialmente, já que quer abrir um processo de assédio sexual contra a empresa e seus colegas. Apesar de recusar a causa no primeiro instante por ser algo inédito, ele decide ajudar a amiga. Josey procura as colegas de trabalho e pede para que elas concordem com o processo e façam uma ação de classe. Mas, não consegue o apoio. A mãe de Josey resolve ficar ao lado da filha e, cansada dos comentários maldosos do marido, sai de casa.
Josey não se cansa e age mais uma vez. Durante a reunião do sindicato, pede a palavra e diz que todos ali deveriam ter respeito pelas mulheres. Vaiada, ela tenta continuar o discurso. Hank não suporta ver a filha ser humilhada e pede silêncio. Ele afirma que ela tem direito de falar já que é sindicalizada como os outros presentes. Este é o momento em que o pai muda de lado e passa a apoiar a filha.
Todo o filme é entremeado com cenas de um tribunal. Mas é, no final que o local torna-se o principal cenário. Durante o julgamento, os advogados de acusação afirmam que
Josey estaria mentindo em relação às tentativas de estupro e assédio sexual, justificando que, no passado, ela já teria se relacionado com diversos homens. Tanto que ninguém saberia quem era o pai de seu filho mais velho. Bill utiliza o argumento e a presença de um dos acusados de ter assediado Josey para reverter o caso. Ele faz com que o colega da protagonista, que também fora namorado da mesma no passado, confirmasse a declaração de que Josey teria sido estuprada por um professor, quando ainda era adolescente. Ele confirma que viu o fato, mas sempre acreditou na versão de que ela teria um “caso” com o ex-professor.
Nesta relação, ela ficou grávida. Bill só conseguiu a confirmação do homem após chamá-lo de covarde, por não ter ajudado a garota enquanto ela era violentada. O fato despertou a atenção de outros presentes ao julgamento. Apesar das revelações, Josey ainda não tinha alcançado seus objetivos. O juiz disse que se ela conseguisse arrumar três testemunhas que confirmassem o assédio dentro da empresa, venceria a ação. Ela já tinha conseguido o apoio do pai e de Glory que, apesar de estar doente e não poder falar sem a ajuda de aparelhos, fez questão de estar presente ao tribunal para ajudar a amiga. Após mexer com o brio dos presentes, Bill faz com que as colegas de trabalho assumam que também passaram por problemas dentro da empresa. Outros homens confirmam o fato. Josey vence a ação e abre precedente para que se crie uma política contra assédio sexual.
Fatos como o de Josey são freqüentes em nossa sociedade até hoje. Diariamente, mulheres procuram a delegacia especializada para relatar as agressões que sofrem dentro de casa. No entanto, algumas não agem contra a violência domiciliar. Muitas aceitam a situação por dependência financeira, outras por medo de que as agressões se tornem mais fortes. No entanto, a polícia tem buscado conscientizar essas mulheres de que é preciso denunciar, em especial agora em que há uma legislação específica para os crimes cometidos
dentro de casa e nos locais de trabalho contra a dignidade física, moral e psicológica das mulheres
Mas vale ressaltar que não é somente a violência física que deve ser denunciada pela
mulher. Josey é um exemplo de que a violência ocorre em todos os níveis. Quando jovem, ela foi estuprada e, após começar a trabalhar na mina, foi “agarrada” por um de seus colegas. No entanto, não foi somente isso que fez com que ela entrasse na Justiça contra os funcionários e a empresa. Xingamentos e insinuações contra a moral de Josey é a prova de que as mulheres ainda enfrentam problemas relacionados à moral.
O Estado tem consciência de que a mulher ainda tem dificuldade de exercer seu papel na sociedade, em especial pelo preconceito. Tanto é que, em 13 de setembro de 2002, o Governo promulgou o decreto nº 4.377 em que afirma saber que “a discriminação contra a mulher viola os princípios da igualdade de direitos e do respeito da dignidade humana, dificulta a participação da mulher, nas mesmas condições que o homem, na vida política, social, econômica e cultural de seu país, constitui um obstáculo ao aumento do bem-estar da sociedade e da família e dificulta o pleno desenvolvimento das potencialidades da mulher para prestar serviço a seu país e à humanidade”
Durante a palestra, Tereza afirmou que “ser feminista é ser contra a cultura estabelecida”, em que os conceitos machistas se sobrepõem. Não é necessário conhecer os conceitos feministas ou ser adepta deles para se defender os direitos. O que as mulheres querem é que a regras sejam seguidas, com o cumprimento do inciso I e do caput do art. 5º da Constituição Federal em que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” e onde “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações”.
Assim sendo, o respeito à pessoa dever ser uma prática cotidiana na vida de todos sem distinção. Todavia, a realidade tem mostrado o contrário e os indivíduos têm se apoderado do poder, inclusive nas instituições onde deveriam combater tais práticas. Nesse sentido, Niki Caro com sua narrativa dramática coloca à descoberta todo um processo de subjugação do corpo feminino no social, em nome de uma hegemonia masculina cuja cultura tem mostrado que a cada dia vem perdendo espaços devido à percepção de que determinadas funções que até então eram masculinas tem sido muito bem exercidas por mulheres.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. Petrópolis, Vozes, 1987.
GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos. São Paulo: Perspectiva, 2007.CARO, Niki. Terra fria. 2005.
* Professor de Lingüística, Linguagens e Literatura da UNEB – Campus XVI – Irecê – BA.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

PUERIS EFÍGIES

Era manhã e os olhos
Ainda preguiçoso sob o
Resplandecer da alvorada
Viram-te aparecendo do nada.

Coração e mente reviveram
Anos num instante;
Pueris imagens sufocaram
O peito e num ímpeto, lhe quis
Como se antes tivesse sido minha.

Agora, efígies não vividas
Invadem-me a alma que,
Em abastança vazia
Nutre-se do passado
Que nem se quiser existiu.

27 de novembro de 2008, 18h.
Robério Pereira Barreto

ESCRAVO DO AMOR

À alma solitária
E escrava desse amor
Premio-te com o clamor:
Oh, minha senhora;
A cada instante em que se
Lembrar de quem eu sou
Sofra a angústia de ter
Me feito sentir um sofredor;

A esse coração que em queixas se esvai
Dou-lhe a chance de sentir seu algoz
Nos instantes infernais que,
Ao lembra-se de que
A paixão e o amor por ti
O fizeram um ser bestial.

Oh, Escravo do amor...
Cumpras teu destino;
Seguem sem reclame nem dor.

Oh, Escravo do amor...
Sufoque-se em seu soluços...
Mutile sua própria pele...
Afogue-se nas lágrimas vertidas
Na dor de se afastar de sua Senhora,
Mate-se com o punhal da solidão...

BARRETO, R.P. In: BARRETO, R.P. Bramidos da solidão, Irecê [BA] edição do autor, 2007, p.63.

VIAGEM

Nas águas da minha saudade
Singram no meu ser as naus
Que trazem lembranças de ti.
Tal Dom Quixote faceiro,
Meu peito carrega um coração
Que flameja de desejo por ti
Como os olhos de Capitu,
Diante da resseca do mar.
O madeiro da saudades
Debruça sobre ondas revoltas
Para trazer-me seu cheiro
E calor exalados no prazer
Ao navegar no Cruzeiro do amor.
BARRETO, R.P. In. BARRETO, R.P. Cores da Solidão. Tangará da Serra [MT]. Edição do autor, 2005.

domingo, 23 de novembro de 2008

DENODO

Na intrepidez do amanhã
Com jeito de ontem,
Ofereço a ti a lua
Na bandeja de prata
Com calda de maça.

Na ousadia de meu querer
Devoto a ti sabor da alma
Que em amor deságua
Ao seu acalanto.

Com olhos rutilando desejos vivos,
Dou-te rosas despetalando ao
Toque macio de suas mãos.

Invoco a ti a mais fina seda
A cobri-lhe tão belo corpo
Protegendo-o das malicias
Dos ventos da noite que
tão galantes te acaricia.


23 de novembro de 2008, 23h43min.
Robério Pereira Barreto

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

SOLEIRA DO PEITO

Na soleira do meu coração
Pisastes firme com o pé
Direito de paixão.

Aconchegas ti agora
No recanto do peito,
Levando-me gemer...

Com passadas firmes
Faz-me corpo estremecer,
Sentir-te no meu íntimo
É como viajar no prazer...

20 de novembro de 2008, 22h51min
Robério Pereira Barreto

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

ENTREGO-ME A TI...

Quero sentir-me dentro de ti
Como o sangue que lhe escorre
Pelas entranhas.

Quero penetrar-te profundamente
Tal riacho que com sua água pura
Embrenhar-se malicioso entre a rocha,
Fazendo-a gemer ao sentir
Escorrendo dentro de si
O líquido da vida.

Quero-te tão infinitamente minha
Que se morresse seria capaz também
De morrer para encontrar-te no Hades
De onde lhe tiraria das mãos de Plutão.

Resgatada dar-te-ia meu coração
E como muito ardor me entregaria
A este corpo, infinitamente belo
Cuja maciez da pele é tentação.

19 de novembro de 2008, 22h45min
Robério Pereira Barreto.

SIGNIFICADO: UNIDADE CULTURAL



O texto a seguir é um recorte da matéria sobre o significado. No campo da semântica isto tem pretensões apenas de orientar os estudos sobre o sentido das palavras e os símbolos decorrentes da produção escrita em voga no decorrer das atividades em curso; aulas de semântica no curso de letras. Tais produções, obviamente são escritas e, portanto, têm em suas estruturas elementos ideológicos e, por isso, se tornam importante para a compreensão do pensamento do cursista de letras a respeito do(s) sentido(s) que a cultura atribui aos discursos escritos por ele estudados. Assim, tal ação decorre daquilo que Bakhtin entendia como “ato de fala sob a forma do discurso escrito é de certa maneira parte integrante de uma discussão ideológica em grande escala: ele responde a alguma coisa, refuta, confirma, antecipa as respostas e objeções potenciais, procura apoio, etc.” (BAKHTIN, 2005, p. 7).
Neste conjunto, como se ver, busca-se contemplar o universo dos significados propostos pelas unidades culturais – sentidos - construídas a todo instante pela sociedade; textos e imagens. Até porque o conceito de língua que se aplica aos estudos semânticos não a contempla como sistema estático, ao contrário, a tem como sistema cuja estrutura é flexível exatamente na parte dos sentidos, isto é, as palavras ganham significação na medida em que a sociedade lhes faz uso. Na verdade, no que diz respeito à “Semântica”, o estruturalismo lingüístico não pode deixar de desembocar em um estruturalismo filosófico que tenta abarcar no explicável o resíduo inexplicável a posição histórica das palavras no bojo das questões comunicativas. (Grifo meu). “[...] o indivíduo é interpelado como sujeito [livre] para livremente submeter-se às ordens do Sujeito, para aceitar, portanto, [livremente] sua submissão...” (PÊCHEUX, 1997, p. 281).
Em tal perspectiva, pode-se considerar que em semântica não há neutralismo. Esse pensamento considera que as palavras como instrumentos poderosos, refletem a posição do sujeito no discurso, e com isso pode se transformam tanto em armas como em veneno, ou tranqüilizantes à medida que se aplica ao controle ou incitação das massas.
Para Bréal a palavra deve ser considerada em suas relações com outras palavras, no conjunto do léxico, nas frases em que aparecem, pois é através dela que consideramos a história ou parte dela, ao realçar seu sentido no contexto sócio-cultural. “Tomar uma palavra à parte é um método quase tão artificial quanto dar, como se é obrigado fazer em fonética, a história de uma vogal ou de uma consoante. As letras não têm existência senão nas palavras, as palavras não têm existência senão nas frases.” (BRÈAL, 1983, p. 133, apud GUIMARÃES, 2005, p. 13).
Dessa maneira, faz-se importante entender que a linguagem é, por seu turno, um fenômeno humano, cuja característica principal é sua historicidade. Nessa perspectiva, eis que surge a semântica de Brèal como sendo uma ruptura com a posição naturalista que considerava a linguagem como organismo, como um quarto reino da natureza, afirma Guimarães. (2005, p.16).
A constituição do significado está situada na condição humana de conhecer e reconhecer o signo a partir da subjetividade que ele oferece, pois, para Brèal “o aspecto subjetivo da linguagem é representado por palavras, membros de frases, formas gramaticais e pelo plano geral de cada língua.” Ou seja, as línguas têm as marcas dos elementos subjetivos [...] a língua tem forma própria para expressar o elemento subjetivo da comunicação a seu modo de ver o mundo dos enunciadores e enunciatários. Portanto, “a semântica se constitui como uma disciplina histórica, por se considerar que a linguagem é feita de signos, ou seja, que seu caráter fundamental é simbólico e não natural.” (GUIMARÃES, 2005, p. 17).

Abstracionismo e significação nas palavras

Diante do quadro demonstrado por Brèal, torna-se pernicioso querer sustentar a univocidade do significado. Então, passa-se a considerar o que todos lingüísticas concordam; o significado de uma expressão é a relação que se estabelece entre essa expressão e algo não-linguístico.

significado é a relação que se dá entre as expressões lingüísticas e o uso que os falantes fazem delas (proposta, por exemplo, dos defensores da chamada semântica de atos de fala); para outros, ainda, o significado é a relação entre as expressões e algo equivalente aos conceitos mentais propostos pela teoria ideacional do significado, resultando na contraparte relacional. (NETO, 2003, p.10).

De certo modo, infere-se que o objetivo da teoria semântica consiste em estabelecer relações existentes entre as expressões das línguas naturais e as representações semânticas. Assim, Neto considera que “entender o significado de uma expressão é estabelecer uma conexão entre a expressão e as entidades não-lingüísticas a que a expressão se aplica.” (NETO, 2003, p.10).
Nesse espaço se discuta o abstracionismo do significado e a importância de se compreender o estudo das línguas naturais, o qual não é um assunto livre de polêmicas. Ao contrário, as linguagens formais dos lógicos e dos matemáticos nada tema a dizer sobre os problemas das línguas naturais, que são instituições de outra ordem e com outra natureza. Até porque as línguas naturais são “maiores” do que as linguagens formais, i.e., todas as linguagens formais estão, de uma forma ou de outra, contidas na língua natural. Esta afirmação de Neto, quando sugere que seguir modelos no plano dos estudos semânticos é arbitrário e infrutífero.
Nessa perspectiva de discussão conceitual e teórica, sabe-se que, argumentar torna-se uma atividade importantíssima em lingüística, pois, através dos significados atribuídos ao discurso, o argumentador pode influência, intencionalmente, tanto o meio como o contexto, promovendo neles alterações no modo de perceber os objetos, e, inclusive seus próprios argumentos.
Com base nisso, Nascimento toma como exemplo de texto argumentativo o editorial de jornal no qual a empresa representa sua opinião através do pensamento jornalístico que veicula, e com isso dar a significação que lhe convém para os fatos do dia-a-dia.

A ESCRITA TECNOLOGIA INTELECTUAL

Não é suficiente conceituar ler e escrever, é fundamental desejar e possibilitar sua realização. Barreto, 2004.

Para Lévy (1999), a escrita nos nossos meios de comunicação contemporâneos encerra em si mesma, o poder de registrar acontecimentos e reorganizar o papel das ciências. Por isso, ele considera que a interpretação dos sentidos encontra seus fundamentos na escrita, porque “o alfabeto e a impressão, aperfeiçoamentos da escrita, desempenharam um papel essencial no estabelecimento da ciência como modo de conhecimento dominante”.[1]
As escritas desenvolveram na comunidade instrumentos de significação e símbolos que levaram o homem contemporâneo a questionar a oralidade. Isto é, a comunicação na sociedade era realizada através da oralidade, quando os cidadãos transmitiam seus conhecimentos, mitologias e lendas de “boca a boca”. Logo, precisaram de um instrumento que guardasse física e organicamente as idéias construídas na comunidade. Com isso, a escrita ganha ares de tecnologia. A exemplo disso, está a literatura a qual com o domínio das tecnologias da escrita passou a ocupar lugar significativo na vida social das pessoas. Embora saibamos que nesse período uma parte significativa da população do século XIX, não tinha formação escolástica. Portanto, segundo Lèvy “(...) compreender o lugar fundamental das tecnologias da comunicação e da inteligência na história cultura nos leva a olhar de uma nova maneira a razão, a verdade, e a história, ameaçadas de perder sua preeminência na civilização da televisão e do computador.”[2]
A escrita como tecnologia de comunicação, tornou possível o acesso da massa a conhecimentos que antes eram transmitidos a sociedade por meios de conversas em que as experiências coletivas se mantinham guardadas na memória, formando assim, imagens na ecologia cognitiva do sujeito. Por isso Lévy afirma que a invenção da escrita está relacionada com a invenção da agricultura.
A escrita foi inventada diversas vezes e separadamente nas grandes civilizações agrícolas da Antiguidade. Reproduz, no domínio da comunicação, a relação com o tempo e o espaço que a agricultura havia introduzido na ordem da subsistência alimentar. O escriba vaca sinais na argila de sua tabuinha assim como o trabalhador cava sulcos no barro de seu campo. É a mesma terra, são instrumentos de madeira parecidos, a enxada primitiva e o cálamo distinguindo-se quase que apenas pelo tamanho. (...) A agricultura, pelo contrário, pressupõe uma organização pensada do tempo delimitado, todo um sistema do atraso, uma especulação sobre as estações. Da mesma forma, a escrita, ao intercalar um intervalo de tempo entre a emissão e a recepção da mensagem, instaura a comunicação diferida, com todos os riscos de mal-entendidos, de perdas e erros que isto implica. A escrita aposta no tempo.
De acordo com a ótica do autor, podemos compreender que a escrita dialetiza os conhecimentos, pois se transforma à medida que a comunidade lhe da funcionalidade. Na história mais recente (século XIX) a escrita transformou-se em tecnologia de comunicação avançada a partir da compreensão de que “a arte (literatura) é um sistema simbólico de comunicação inter-humana, e como tal interessa ao sociólogo.”[3] Com isso foi possível que a população tivesse acesso a informações que traduzia suas classes sociais. A exemplo disso, temos os folhetins os quais revolucionaram a atividade literária e escrita na França e, por conseguinte no Brasil romântico.
Associar a escrita à burguesia é, sem dúvida, correr o risco de ser redundante. Por isso, acreditamos que a escrita como todos os instrumentos tecnológicos de comunicação serviu mais diretamente aos ideais dominantes do que às necessidades da massa. Corroborando conosco Lèvy argumenta que a escrita e o Estado mantiveram relações íntimas. O Estado serviu-se dos princípios orientadores e misteriosos da escrita para manter a ordem de seu discurso sem que houvesse questionamentos (lembremo-nos que a maioria da população ainda não domina a escrita e a leitura. Portanto, absorvem os discursos orais e imagéticos produzidos por aqueles que conhecem o universo da escrita. Por isso, talvez, a televisão ocupe cada vez mais o espaço do livro em nossa sociedade).
Através da escrita, o poder estatal comanda tanto os signos quanto os homens, fixando-os em uma função, designando-os para um território, ordenado-os sobre uma superfície unificada. Através dos anais, arquivos administrativos, leis, regulamentos e contas, o Estado tenta de todas as maneiras congelar, programar, represar ou estocar seu futuro e seu passado. (...) A escrita permite uma situação prática de comunicação radicalmente nova. Pela primeira vez os discursos podem ser separados das circunstancias particulares em que foram produzidos.

Para concluir temporariamente, entendemos que a escrita se tornou na sociedade contemporânea mais que instrumento tecnológico é, portanto, ferramenta social, ideológica que permite, embora de forma unilateral a participação da comunidade no registro de seus feitos.
[1] PIERRE, LÈVY. As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. São Paulo: Editora34, 2000, p. 87.
[2] Idem.
[3] CANDIDO, Antonio. Literatura e sociedade. 8. ed. São Paulo: T.A. Queiroz, 2000. p. 21.

O SILÊNCIO E A REIFICAÇÃO DO CORPO FEMININO


Este trabalho tem como objetivo visualizar o silêncio e a reificação do corpo feminino, em 234 contos – Dalton Trevisan -, buscando destacar o poder masculino empreendido no discurso direto dos personagens masculinos
Escrever sobre o silêncio é uma tarefa que apresenta de imediato, dificuldades, sobretudo, quando a escrita está relacionada com o texto literário, sendo que a linguagem literária sustenta-se num sistema semiótico secundário, o qual busca afirmação para o significante no sistema lingüístico. Logo, é licito dizer que é a partir desse entendimento que se constrói os discursos literários numa perspectiva de conotação. Se entendermos que o silêncio, também é um tipo de expressão/discurso e que tem certo grau de conotação, sem dúvida, a contribuição de Lefebvre sobre o conceito de conotação corrobora de maneira magistral para a compreensão das nuances que subjazem o silêncio que torna o corpo feminino das personagens de Trevisan algo reificado no texto literário.
Uma verdadeira conotação só se manifesta quando a palavra é empregada precisamente por oposição à palavra corrente ’flingue’ é calão e reenvia, por isso, a um certo meio social. Parece, pois, que o termo conotação deve ser reservado para sentidos de uma palavra ou de uma expressão que podem existir virtualmente na experiência que temos da coisa designada por essa palavra, ou nas associações que nascem do uso que se faz dessa palavra (ou expressão) na linguagem em geral, ma que só se actualizam pelo seu emprego particular num certo discurso. A conotação é um sentido que só advém à palavra numa dada situação e por referência a um certo contexto (de linguagem ou vivido)[1].

Dessa maneira, convém deixar claro que, tomo o silencio como uma forma de discurso que, certamente, provoca reflexão, de qualquer maneira, creio que seja interessante dizer já de imediato que a premissa básica para o desenvolvimento desse trabalho é a observação das marcas que o silencio deixa no discurso do texto literário moderno. Todavia, convém afirmar que tal procedimento será realizado a partir da análise dos contos de 234, de Dalton Trevisan, que em seu bojo tem uma série de expressões discursivas que conotam ideologias que não são completadas pela linguagem verbal.
há uma dimensão do silêncio que remete ao caráter de incompletude da linguagem: todo dizer é uma relação fundamental como não dizer. O silêncio é assim a “respiração” (o fôlego) da significação; um lugar de recuo necessário para que se possa significar, para que o sentido faça sentido. Reduto do possível, do múltiplo, o silêncio abre espaço para o que não é “um”, para o que permite o movimento. O silêncio como horizonte, como iminência do sentido... (ORLANDI, 1997, 12-13).

As relações discursivas criadas na narrativa de ficção contemporâneas têm movimentado uma série de estudos, despertando assim o interesse da crítica e dos estudiosos. Todavia, isso não é gratuito, pois os debates atinentes, a questão sígnica do silencio no discurso literário, tem de tal modo considerado esta marca lingüística como uma forma de expressão.
No plano lingüístico, este evento leva-nos a velha polêmica da filiação teórica, isto é, o signo lingüístico é interpretado de maneiras diferentes, de forma que a Semiótica e a Analise do Discurso tem realizado ações conflitivas quando das observações das marcas que configuram o silencio. Se aceitarmos a idéia de que a teoria da análise do discurso, certamente parte para o porto que leva a inferência de que somos resultado dos discursos apreendidos ao longo de nossa existência, em contrapartida temos a Semiótica e o Estruturalismo Lingüístico que nos remete ao pensamento de que todo signo tem uma função ideologia, estando implícita ou não na construção discursiva.
Entendendo que este estudo deve pauta-se numa teoria, elegemos para tal fim a teoria de Bakhtin, destacando a linha que dá conta da interação verbal, cujo cerne é o pensamento filosófico - lingüístico que liga os discursos literários.
Este trabalho visa argumentar e colocar em discussão alguns pontos que marcam o processo narrativo de Dalton Trevisan, de maneira que a eleição da obra 234 dar-se em virtude da configuração do espaço discursivo empreendido na narrativa, de tal maneira que o autor realiza o discurso em uma linha seqüencial, possibilitando assim a diluição do silencio num contexto altamente contrastivo, isto é, de um lado a cultura machista – poderosa imponente - de outro a feminina, submissa e quase imperceptível na fala do narrador, concretizando assim o pensamento bahktiniano que afirma:
O subjetivismo individualista apóia-se também sobre a enunciação monológica como ponto de partida da sua reflexão sobre a língua. É verdade que seus representantes não abordaram a enunciação monológica do ponto de vista do filólogo de compreensão passiva, mas sim de dentro, do ponto de vista da pessoa que fala, exprimindo-se.


Assim sendo, busca-se sustentação teórica nas observações dos estudos semiológicos realizados pelos membros do círculo de Bakhtin, o que conseqüentemente, levará aos estudos da análise do discurso, pois o texto de Trevisan está carregado de símbolos, inclusive o silêncio, que está configurado nas marcas lingüísticas. Dessa maneira, é lícito que se transite também nas idéias de Roland Barthes y Pêcheux, que certamente nos orientará sobre os processos lingüísticos que subjazem a questão do silencio no discurso literário.
Entende-se que o silêncio é uma forma de expressão, de modo que o discurso empreendido por Trevisan na obra em questão situa-se num ponto nefrálgico deste trabalho, de tal maneira que o texto em estudos está repleto de pontos em que se apresenta a submissão da mulher. Com efeito, registra-se isso com maior vigor nos contos em que as personagens femininas ouvem os discursos dos personagens masculinas sem fazer contestação.
No plano filosófico e, sobretudo, ideológico da linguagem Bakhtin (1997:31-38) corrobora ao afirma que “um produto ideológico faz parte de uma realidade (natural ou social) como todo corpo físico, instrumento de produção ou produto de consumo; mas, ao contrário destes, ele também reflete e refrata uma outra realidade, que lhe é exterior. Tudo que é ideológico possui um significado e remete a algo situado fora de si mesmo. [...] tudo que é ideológico é um signo. Sem signo não existe ideologia.”
Neste caso, é possível perceber que os silêncios em um discurso carregado de pausa como o existente em 234 levam-nos a inferir que tal atitude narrativa é uma forma ideológica, em que está implícito todo poder de uma cultura baseada nos mandamentos machistas. Todavia, as personagens femininas agem de maneira silenciosa, possibilitando uma ação dissimulada dos episódios que estão presentes na estrutura discursiva dos personagens masculinas.
Partindo de um pressuposto filosófico, sobretudo no que se refere ao processo condenativo empreendido pelos personagens masculinos contras as femininas dos contos em estudos, poder-se-ia dizer que Foucault (1987), estabelece este tipo de castigo como sendo o resultado de um no código corretivo, no qual “as punições estão menos diretamente físicas, certa discrição na arte de fazer sofrer, um arranjo de sofrimento mais sutis, mais velados e despojados de ostentanção.”
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
BACCEGA, Aparecida Maria. Palavra e discurso: história e literatura. 2. ed. São Paulo, Ática, 2000.
FOUCAULT, M. História da sexualidade I: vontade de saber. Trad. Maria Thereza da Costa Albuquerque e J. A Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1990.
LEFEBVE, Jean-Maurice. Estrutura do discurso da poesia e da narrativa. Coimbra, Livraria Almedina, 1980.
ORLANDI, Eni Puccinelli. As formas do silêncio: no movimento dos sentidos. 4. ed. Campinas, Editora da UNICAMP, 1997.
TREVISAN, Dalton. 234 contos, Rio de Janeiro: Record, 1997.
WALDMAN, Berta. Do vampiro ao cafajeste: uma leitura da obra de Dalton Trevisan. 2. ed., São Paulo, Hucitec, 1989.

[1] LEFEBVRE, 1980, p.58.

CANÇOES DE NINAR: É HORA DE DORMIR ENTRE ANJOS E FERAS

Robério Pereira Barreto*
Antes de adentramos no elemento temático deste trabalho – A manipulação do corpo infantil a partir das canções de ninar – façamos, pois, um passeio pelos usos que pais e babás fazem das canções de ninar. Normalmente, as canções selecionadas por eles para embalar o sono das crianças são culturalmente formatadas a partir do poder dos seres sobrenaturais (Cucas, Boi da cara-preta, Bicho do mato, Bicho papão, etc.) existentes nos textos que as compõem. Portanto, isso parece demonstrar que eles [pais] perderam o controle sobre as vontades das crianças e (in)conscientemente apelam para esse tipo de discurso, cujo ritmo e sonoridade fixam na mente dos pequenos algo paradoxal: a possibilidade de ter um sono tranqüilo conquanto anjos se mistura com as feras mostradas por aqueles que deveriam os proteger. Com efeito, compreendemos que, a todo o momento, há nessa atividade o resgate de elementos que historicamente cristalizam o poder do adulto, fixando assim, nos seres humanos em desenvolvimento a disciplina, usando a figura do medo. Isso nos remete ao pensamento foucaulteano que discorre sobre os corpos dóceis. As crianças por essência são corpos manipuláveis, e assim os protetores têm nas canções de ninar o instrumento perfeito para tanto. Parafraseando Michel Foucalt diríamos que, o corpo e a mente da criança são postos num esquema em que o poder dos adultos os esquadrinham de tal sorte que ela torna-se disciplinada. “Esses métodos que permitem o controle minucioso das operações do corpo, que realizam a sujeiçao constante de suas forças e lhes impõem uma relação de docilidade-utilidade, são o que podemos chamar as disciplinas.[1]”Para exemplificar o que estamos discutindo, seguem fragmentos de canções de ninar mais conhecidas na cultura popular brasileira: Boi, boi, boi/Boi da cara preta,/pega essa criança/Que tem medo de careta.(Boi da cara-preta); Bicho do mato,/que come mandubi[2],/ pega essa criança/que não quer dormir. (Bicho do mato); Dorme nenen,/Que a cuca vem pegar,/Papai foi na roça, Mamãe foi passear[3].(Cuca). Conforme já mencionamos, este tipo de atitude apenas reforça o poder que os adultos exercem sobre os corpos infantis, causando neles marcas psicológicas que os acompanharão por toda a vida. Entendendo que a palavra em sua essência busca a imagem, logo vimos que tais textos estão carregados de imagens negativas e, por isso, as crianças que ouvem essas canções rotineiramente terão sua imaginação voltada para tendências maniqueístas, ou seja, aquelas que seguirem os ensinamentos pré-estabelecidos pelo corpo social, ora representado pelos pais ou babás [dormir na hora certa sem chorar ou protestar quando estiver sentido algo] terão a companhia dos anjos. Já as que se recusarem terão em seus sonhos a presença de feras e monstros. Com efeito, nesses discursos a significação poética visa à fixação das imagens a partir do ritmo e da sonoridade das palavras. Nessa perspectiva é importante destacarmos que, as canções de ninar são cantadas em horários fixos, indicando que desde cedo o ser humano tem regras para seguir. Portanto, eis aí os primeiros elementos que indicam que “o tempo penetra o corpo, e com ele todos os controles minuciosos do poder[4].” Concluindo provisoriamente, esta receita tradicional [embalar o sono sob som de cantigas de ninar] é manter ações coercitivas sobre o corpo e a mente da criança, a pretexto de que; a arte e música a mantêm calma. Entretanto, o uso dessa técnica, disciplinará a criança para a execução dos desejos dos adultos [pais e babás ocupados com a correria da vida moderna] que precisam estar livre o maior tempo possível, aplica-lhe tais regras sob o pretexto da iniciação ao conhecimento artístico e popularmente aceito.
* Professor de Lingüística e Linguagens, da Universidade do Estado de Bahia – Campus XVI –Irecê - BA
[1] FOUCAULT, Michel, Vigiar e Punir. Nascimento da prisão. 28. ed. Petrópolis, Vozes, 1987, p. 119.
[2] Mandubí, em algumas regiões do país é o mesmo que amendoin.
[3] Trechos de músicas que, segundo depoimentos de mães e babás, são músicas que acalanta filhos e crianças quando estão chorando e elas não sabem o que fazer para acalmá-las.
[4] FOUCAULT, Michel. 1987, p. 130

CONSCIÊNCIA QUE SOMOS MASOQUISTAS

SOU NEGRO E DAÍ?

Era dia, entre os meus dizia:
Aqui nascemos e viveremos
Cuidando de nossos filhos
E tradições até que um dia
Sem convite nem alegria
Eles chegaram e levaram
A mim e os meus por
Caminhos e mares desconhecidos.

Lutar? Lutamos e muito
Mas foi tudo em vão
Éramos reis fortes
E tínhamos nossas consortes.

Mas, Eles tinham armas que soltavam fogo
Como se fossem dragões a nos devorar.
Para piorara era pequeno e mau seus corações;
Que Fizeram de nós animais
E não parava de nos judiar.

Subjugados por suas infames vontades
Quem era rei na sua terra
Depois de dominado pelas forças más
Do estranho que acabara de chegar;
Em negro de eito e cama
Tinha que se transformar.

Nós, os homens aos senhores riquezas
No canavial e engenho tinha que dá
Nossas, mulheres, irmãs e filhas
Na cama a eles tinha que se sujeitar
Além do prazer que a força tirar
Seus filhos impuros os deles iam amamentar

Nem um só instante de alegria
A cada nascer e pôr do sol
Cristaliza-se a alma sofrida,
E uma lágrima mesmo espremida
Da face descia com gosto de mar
Por onde um dia quis tanto a minha casa
E aos meus regressar.

Sonho que se foi vão
Ficando a dor e a solidão
Aos matando aqueles que ainda
Estavam por acreditar
Que, com a quebra das correntes
Poderíamos a liberdade gritar.

É engano! Engano É!
Negro foi rei, príncipe talvez
Hoje é Negro e pra sempre será,
Carregando na sua face e alma
Marcas da falsidade humana
Que tentam a todo custo negar...

19 de novembro de 2008Robério Pereira Barreto

A FICÇÃO CONTEMPORÂNEA URBANA (1970 AOS NOSSOS DIAS)

A partir da década de 1970, a ficção brasileira de temática urbana foi condicionada por uma série de novos fatores econômicos, políticos e sociais, a saber:
· - A ditadura militar prolongou-se por muito mais tempo que os oposicionistas imaginavam. O que era visto apenas como um golpe, condenado a curto prazo ao fracasso, consolidou-se como um longo regime com significativo apoio popular. Contudo, a crise do petróleo de 1973, os altos custos de empreendimentos estatais e as graves dificuldades do capitalismo internacional em fins dos anos 70 e início dos 80, fizeram com que a inflação se tornasse incontrolável. Só então a ditadura conheceu a impopularidade.
· - Obrigados a entregar o poder à oposição confiável (Tancredo Neves-1985), os militares retiraram-se discretamente da política brasileira para não mais voltar. Uma democracia ampla e bastante liberal estabeleceu-se no país. A censura foi abolida, o habea-corpus restabelecido e as diversas formas de controle social foram completamente abrandadas. No entanto, a redemocratização não trouxe nem o controle da espiral inflacionária nem o retorno ao desenvolvimento. A derrubada da inflação viria ocorrer apenas com o Plano Real, em 1993.
· - Os ideais esquerdistas-autoritários que imperavam entre a intelectualidade brasileira foram golpeados pelo desmantelamento da guerrilha (1969-1972) e, mais tarde, pela queda do Muro de Berlim e pelo colapso geral do socialismo. Muitos artistas e escritores viraram então "órfãos da utopia". Também o chamado "radicalismo democrático" da esquerda mais recente tem sido bastante abalado com a tendência centrista do governo Lula, o primeiro presidente a ser eleito por forças progressistas no país. Por isso, a "intelligentzia" parece ter perdido todos os seus referenciais utópicos, o que ajuda explicar um certo ceticismo generalizado que percorre a produção cultural contemporânea.- Por outro lado, de 1970 para cá o Brasil configurou-se definitivamente como uma nação capitalista e moderna, ainda que cheia de desigualdades sociais. O espetacular crescimento econômico da década de 1970 (em média quase 10% ao ano) atraiu milhões de trabalhadores rurais para as cidades. Muitos se integraram satisfatoriamente à vida urbana; outros foram sobreviver em favelas que brotaram aos magotes. Hoje elas circundam as principais metrópoles do país. Nas décadas de 1980 e 1990, as taxas de crescimento da economia baixaram significativamente, não permitindo uma efetiva integração das camadas pobres ao establishement nacional.
· - Ainda que o êxodo rural e o pífio desenvolvimento econômico dos últimos anos expliquem a ampliação do número de miseráveis, outra circunstância tem peso decisivo neste processo. A ilimitada liberação sexual, que estimulou a gravidez sobremodo entre adolescentes, fez com que, entre a população marginal (ao contrário de outros setores) o aumento da natalidade tivesse uma progressão geométrica, criando um problema praticamente insolúvel: como integrar ao sistema econômico os mais de cem milhões de brasileiros gerados nas últimas décadas?
· - Ao mesmo tempo, no plano dos valores, assistiu-se à derrocada final dos códigos de existência da sociedade patriarcal/agrária, substituídos por novos comportamentos e novas expectativas, todos correspondendo a princípios urbanos e capitalistas. O domínio do individualismo, a busca da felicidade pessoal, tanto em seus aspectos emocionais quanto sexuais, o culto ao dinheiro e à fruição de bens de consumo constituíram, a partir de então, os pilares éticos da nova sociedade brasileira.
Face a tais transformações – vertiginosas e radicais – os escritores tiveram uma experiência coletiva de esfacelamento e pulverização da realidade, quando não de caos. A velha ordem desabava e um mundo instável, frenético e aparentemente irracional ocupava o seu lugar*.Todas estas mudanças influenciaram decisivamente a prosa de ficção de temática urbana das últimas décadas. Apesar da proximidade histórica do período, podemos apontar algumas das tendências essenciais que configuram a atual produção ficcional brasileira:
1) Desintegração das formas realistas tradicionais, que haviam predominado (com as exceções de Clarice Lispector, Murilo Rubião e João Guimarães) até o fim da década de 1960. A partir dos 70, rompe-se com a linearidade narrativa e abandona-se toda a pretensão de uma concepção totalizante e lógica do mundo. Em admirável ensaio, José Hildebrando Dacanal fixou o caráter desta decomposição do realismo:
O mundo está destroçado e não há como remontar seus estilhaços. Os personagens padecem de total desorientação, sendo incapazes de organizar-se a si próprios e, muito menos, ordenar o universo à sua volta. Desesperados, buscam uma verdade, sem saber se há possibilidades de encontrá-la. Ou nem mesmo a buscam, limitando-se a sofrer ou a protagonizar a desordem, a violência física e moral e a destruição das formas de convivência social. (...) À desintegração ética corresponde à desintegração técnica, com a estrutura narrativa revelando-se desordenada, fragmentada e geralmente sem um foco narrativo, ou ponto de vista único ou claramente definido.
Entre os autores que expressam esta tendência encontramos Rubem Fonseca (O caso Morel, Lúcia Mcartney); Ivan Ângelo (A festa); Roberto Drummond ( D.J. em Paris); Antonio Torres (Os homens de pés redondos, Um cão uivando para a lua e Essa terra); Lygia Fagundes Telles (As meninas); Márcio Souza (Galvez, o Imperador do Acre); e Sergio Sant´Ana (Confissões de Ralfo). Contudo, quem condensou mais radicalmente as inovações técnicas e expressou mais fielmente a natureza caótica da época foi Ignácio de Loyola Brandão com o polêmico romance Zero.
Não se pode subestimar tampouco a poderosa influência exercida sobre estes autores pelos ficcionistas do chamado “boom latino-americano”: García Márquez, Alejo Carpentier, Mario Vargas Llosa e Carlos Fuentes, entre outros, já tinham equacionado o problema da construção de um mundo romanesco, valendo-se de procedimentos narrativos revolucionários e ao mesmo tempo sendo capazes de apresentar sugestivas totalizações da realidade. Eram, portanto, modelos insuperáveis da nova ficção que aqui se procurava fazer.
Ressalte-se, por fim, que já no final da década de 1970 e nas décadas seguintes, esta força de desintegração, que parecia arrastar a prosa brasileira para o caos, recuou, dando lugar a uma razoável síntese entre ruptura e tradição, fragmentação e criação de mundo. Esta síntese poderia ser designada como uma nova forma de realismo. Quem melhor a elaborou nos últimos trinta anos foi Rubem Fonseca, especialmente em seus contos. Entre os autores recentes cabe papel de destaque a Miltom Hatoum com os excelentes romances Relato de um certo Oriente e Dois Irmãos.
2) A impossibilidade de uma visão totalizante da nova realidade – a busca da totalização é uma das características principais do romance – pode ser a causa do triunfo do conto, que se tornou o gênero mais praticado no país a partir dos anos 70. Lidando com o relato breve, o registro de um flagrante da existência, o conto passa mais ou menos incólume pela desintegração de sentido de uma época. Daí a quantidade de bons contistas que surgiram então. Entre eles destacam-se Sérgio Sant’Anna (Confissões de Ralfo); Deonísio da Silva (Exposição de motivos); Luís Vilela (Tremor de terra); Sérgio Faraco (Hombre); Domingos Pelegrini (O homem vermelho).
3)Paradoxalmente, nos mesmos idos de 1970, ressurgiu uma espécie de realismo social à moda antiga, traduzido por relatos que representavam de maneira direta os dramas das camadas subalternas, sem muitas preocupações com a linguagem.
Era uma resposta à censura imposta pelo regime militar que proibia a imprensa de noticiar os aspectos negativos do país. Era também uma forma de solapar a idéia do "milagre econômico", então dominante nos meios de comunicação, através do registro dos excluídos, das prostitutas, dos operários, dos camponeses, da gente sem eira nem beira, todos sonegados da visão ufanista do governo. Muitas destas obras não passavam de reportagens ficcionalizadas, escritas por jornalistas que se utilizavam da ficção para driblar a censura. O expoente do grupo, contudo, era um bom escritor, João Antônio, que tinha produzido os seus melhores contos nos anos de 1960 e que agora, como um cavaleiro andante, lutava para que os pobres do Brasil encontrassem seu lugar na literatura. No prefácio de Malditos escritores, João Antônio defende a arte como “um corpo-a-corpo com a vida”
Estes escritos cometem (intencionalmente) quase todas as heresias diante de alguns conceitos tradicionais do purismo do fazer literário. (...) Desse corpo-a-corpo nasce uma escritura descarnada.(...) a refletir sem floreio, impostura ou retoques, um mundo de suores, amordaçamentos, pelejas e medos.
Nesta linhagem do realismo social explícito figuram Wander Pirolli, Domingos Pellegrini Jr.Mais recentemente a obra de Paulo Lins, Cidade de Deus poderia ser enquadrada na referida tendência, com a vantagem de apresentar uma "visão de dentro" do universo semi-marginal urbano.
4) Neste período, a ficção introspectiva, à maneira de Clarice Lispector, foi reafirmada nas obras de Caio Fernando de Abreu, Morangos mofados, João Gilberto Noll, Hotel Atlântico e Lya Luft, As parceiras, entre outros. De certa forma, a exploração da subjetividade e a procura da identidade mais profunda dos seres era produto do grau maior de complexidade alcançado pela sociedade brasileira.
5) A partir da década de 1980, possivelmente como uma reação à desintegração das formas tradicionais de narrativa, ganhou espaço o romance histórico, isto é, aquele que evoca fatos e/ou personagens do passado reinterpretados por meio de uma visão crítica e desmistificadora. Normalmente este tipo de romance mantém-se dentro de um código mais ou menos acadêmico de narrar, contrariado experiências similares realizadas por ficcionistas do "boom hispano-americano", na mesma época, marcadas por densa invenção formal. Ana de Miranda, Boca do Inferno, A divina quimera e Luiz Antonio de Assis Brasil, Videiras de cristal e Concerto campestre são os principais representantes do romance histórico. Mas observe-se que escritores de outra linhagem, a exemplo de Rubem Fonseca, O selvagem da ópera, de Nélida Piñon, República dos sonhos, de Deonísio da Silva, A cidade dos padres e de Moacyr Scliar Sonhos tropicais, também se aventuraram neste terreno com resultados estéticos diversos.
6) Nos últimos anos assistiu-se, por fim, a uma crescente propensão de inúmeros escritores à fabricação de "best sellers", sob encomenda de editores ou não. São romances e novelas que atendem a presumíveis exigências do mercado: temas leves e pitorescos, reconstituições históricas convencionais, registro superficial dos costumes e da psicologia dos protagonistas e completa banalidade estilística. Trata-se de uma ficção descartável e freqüentemente idiota. Com muita propriedade o crítico Flávio Khote designou esses relatos como integrantes de uma nova categoria literária, a da narrativa trivial.

2. A prosa de ficção
No campo da ficção, em relação aos mundos narrados, duas tendências gerais predominaram no período:
Obras de temática rural
Obras de temática urbana
A narrativa de temática urbana
A ficção urbana brasileira, produzida entre os anos de 1945 e 1960, tem alguns elementos definidores do ponto de vista estrutural, lingüístico e temático:
A questão estrutural:
A par do romance, que continua sendo praticado, o conto começa a ganhar cada vez mais espaço.
A formulação narrativa da maioria dos autores do período ainda está próxima do modelo neo-realista. Surge um desvio neste modelo tradicional de narrar através da obra revolucionária de Clarice Lispector, marcada por inovações técnicas e sobretudo pelo uso intenso do monólogo interior.
Outra linha de ruptura com o procedimento realista ocorre com a publicação, em 1947, do livro de contos O ex-mágico, do autor mineiro Murilo Rubião. Os seus relatos são alegóricos, ou seja, centram-se em situações inverossímeis ou simplesmente fantásticas que possuem um caráter simbólico.
A questão lingüística:
Sedimenta-se a aproximação - desencadeada pelos modernistas de 1922 - entre a linguagem literária e a linguagem coloquial urbana, conforme se pode verificar, entre outros, nas obras ficcionais de Fernando Sabino e de Carlos Heitor Cony.
A questão temática:
O neo-realismo explicitamente social continua sendo cultivado, sobremodo na década de 60. Sua tradução mais qualificada dá-se na obra de Antônio Callado, que busca registrar de modo amplo e totalizante dos dramas coletivos do país.
Há também um neo-realismo timbrado pela tentativa de síntese entre a realidade objetiva e uma densa subjetividade. Os romances de Lúcio Cardoso, Fernando Sabino, Autran Dourado, Carlos Heitor Cony e os contos de Lygia Fagundes Telles, por exemplo, expressam a dissolução do engajamento ideológico dos anos 30 e 40 e sua substituição por sensações de angústia e náusea, revelando influências do pensamento de Freud e de Sartre.
Absolutamente originais no contexto de sua época são as obras de Clarice Lispector e de Dalton Trevisan, cujos livros inaugurais vieram à luz respectivamente de 1944 e de 1954. Clarice cria no Brasil um tipo de ficção introspectiva em que o mundo concreto se torna quase opaco e pastoso, e os personagens mergulham em um grande vazio. Já Trevisan renova a linguagem do conto e disseca sem compaixão o pequeno universo das classes médias urbanas.
Não devemos esquecer, por outro lado, que alguns dos maiores romancistas de 1930 ainda estavam em plena atividade. Erico Verissimo, por exemplo, escreve nesta época sua obra-prima: O tempo e o vento. Também Jorge Amado produz alguns de seus textos mais apreciados como Gabriela, cravo e canela e Os velhos marinheiros.
3. A nova narrativa de temática agrária
Um fenômeno novo marcou a ficção brasileira, a partir dos anos de 1950: um conjunto de relatos centrados no mundo rural, mas distantes dos padrões convencionais de realismo, que se encontravam, por exemplo, no chamado romance de 30.
O crítico José Hildebrando Dacanal designou esses textos como "nova narrativa épica brasileira". São obras que fixam o "desaparecimento do interior caboclo-sertanejo, face o avanço vertiginoso da civilização racionalista, capitalista e urbana." Esta civilização, nascida no litoral, e que avançava rumo ao oeste, era o fruto da expansão burguesa ocorrida, principalmente, durante a Era Vargas e a Era JK.
Outros críticos referem-se a tais obras como integrantes de um ciclo de "realismo mágico", pois eventos extraordinários ( e inverossímeis do ponto de vista do racionalismo urbano) ocorrem nas mesmas. Os personagens dos relatos vivem esses acontecimentos estranhos sem que isso os surpreenda. Ou seja, a sua consciência de mundo admite como real e natural o que julgamos inconcebível.
Basicamente esta tendência compõe-se de seis romances: Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa, - o mais significativo de todos - e que, ao ser publicado em 1956, abriu caminho para a criação de um novo modelo narrativo no país; O coronel e o lobisomem, de José Cândido de Carvalho, que veio à luz em 1964; Chapadão do Bugre, de Mário Palmério, lançado em 1965; A pedra e o reino, de Ariano Suassuna, que é de 1970; Os guaianãs(em quatro volumes saídos entre1962 e1970), de Benito Barreto; e Sargento Getúlio, de João Ubaldo Ribeiro, publicado em 1971.
As características mais ou menos comuns a todas essas obras são de natureza lingüística, estrutural e temática:
Lingüisticamente, há uma forte presença, ainda que as vezes residual da variante caboclo-sertaneja da língua portuguesa, transfigurada do ponto de vista do estilo por cada autor.
Estruturalmente, a verossimilhança, típica do romance tradicional, não é respeitada, com protagonistas relatando a própria morte, presença de demônios e outras entidades míticas.
Tematicamente, todas as obras possuem um traço comum: a ação se desenvolve, preponderantemente, no interior, no sertão, em regiões de pequena propriedade ou de criação de gado, surgindo não raro um conflito entre este mundo agrário - e os protagonistas dele procedentes - e a civilização urbana. Além disso, como já frisamos, é também freqüente a presença de seres superiores, como Deus e o Diabo, ou entes mitológicos, como a sereia, o lobisomem, etc.
Em termos gerais, pode-se dizer que estes romances se ligam, no plano do assunto, ao Brasil antigo, pré-industrial, marcado por uma cultura rural e religiosa, de raízes ibéricas, transformada ao longo dos séculos.

Referências

BOSI, Alfredo. História concisa da Literatura Brasileira. 38. ed. São Paulo: Cultrix, 2002.
JAKOBSON, Roman. Lingüística, poética, cinema.São Paulo: Perspectiva, 1970.
__________ Lingüística e comunicação. São Paulo: Cultrix, (s.d).
Literatura contemporânea.in.:http://educaterra.terra.com.br/literatura/litcont/litcont_4. acesso em 19 de novembro de 2008.

RESUMO APRESENTADO NO SIEPEX - UNEB - CAMPUS I - SALVADOR

COMUNICAÇÃO DE MASSA E A REOGANIZAÇÃO DO GOSTO POPULAR PELA MÍDIA
Robério Pereira Barreto*

RESUMO: Este projeto teve com objetivo oferecer aos participantes, fundamentos sob linguagem, discurso e ideologia usados pelas mídias de grande consumo para promover os desejos da sociedade contemporânea, sobretudo, aqueles em que figuram a idéia de que a identidade dos sujeitos perpassa pelo consumismo gratuito promovido pelos meios de comunicação de massa. Hodiernamente, o exercício da construção de uma cidadania nas comunidades populares se dá por meio de um espraiamento dos saberes e gostos desenvolvidos pelos veículos de difusão de massa. Isto ocorre devido ao livre acesso aos meios de informação, os quais são planejados como sistemas de conexão entre indivíduos e o meio social a que eles pertencem ou desejam participar. A partir dessa premissa encontraram-se na realidade local, sujeitos envolvidos por um sistema de comunicação em que o rádio assume o espaço importante espaço deixado por outras mídias de maior concentração de mensagens - revistas, jornais de circulação contínua - nos quais as imagens são coloridas e sedutoras. Com base nisso, traçou-se como objetivos a discussão do pensamento de Adorno e Horkheimer sobre o poder da indústria cultural no cotidiano das classes populares. Assim sendo, levou-se aos participantes reflexões sobre a qualidade da informação oferecida a eles como ouvintes e espectadores da mídia de massa no Território de Irecê – BA, especialmente, o rádio. Discutiu-se no decorrer das atividades os sistemas de espetacularização das mídias por meio da massificação da informação, tendo no discurso publicitário comercial e institucional o referente para fabricação de consenso e ideologias, as quais são capazes de reorganizarem os gostos da população em determinado época. Por isso, se elegeu como metodologia, o dialogismo, isto é, os cursistas puderam relatar suas vivências enquanto consumidores e, sobretudo, as influências sofridas pelo ataques constantes das publicidades massiva das mídias digitais, inclusive o rádio e televisão. Para melhor compreendê-los, se fez leituras individuais de texto e em grupos, sendo que cada grupo tinha seu relator e debatedor sobre a temática estudada no texto, criando dessa maneira um processo interativo no qual todos puderam apreciar as discussões e inferências dos demais colegas do curso. E, por conseguinte, foi apresentado um relatório para que todos pudessem ficar com uma cópia ao final do curso. Por isso, foram distribuídas as seguintes ações didático-pedagógicas: a) apresentação dos textos e teóricos (Adorno, Horkheimer, Thompson, Ivan Barbosa e outros; exibição dos filmes Boa noite e boa sorte, de George Cloney; Click de Frank Coraci; b) discussão e debate sobre as narrativas fílmicas; d) retorno à leitura e exposição dos entendimentos a respeito da posição dos autores lidos e; mesa de debates onde se discutiu questões cotidiana da comunicação de massa, rádio no Território de Irecê-BA. Esta primeira etapa do projeto atendeu a vinte e dois estudantes, os quais estavam distribuídos entre graduandos do curso de Letras, Pedagogia da Uneb e estudantes de outra instituição de ensino superior. Sua carga horária (40h) foi realizada com êxito, além disso, se exigiu do participante relatório final do curso, do qual se transcreve: “O curso proporcionou a participação ativa do aluno no decorrer do mesmo, através de um diálogo entre nós participantes e o professor, participantes estes que não se resumiram apenas em discentes da UNEB, mas alguns oriundos de outras instituições de ensino da cidade. Ou seja, foi proporcionada uma integração universidade e comunidade.” (Souza, 2008).
* Professor de Linguagens e Educação e Lingüística da UNEB – DCHT- Campus XVI – Irecê – BA. Endereço eletrônico: jpgbarreto@gmail.com, diário eletrônico: www.poetadasolidao.blogspot.com.

TEXTOS E AÇÃO DIALÓGICA ENTRE SUJEITOS E ESPAÇOS

Só podemos partir para a descoberta de nossa alma utilizando o espelho dos homens que nos olham. Michel Mafessoli

Antes de se imergir no universo conceitual de gêneros textuais e discursivos que permeiam a mídia, é importante dizer que a sociedade em que se vive hoje, é um espaço de letramento e por isso demanda de novos elementos sintagmáticos e paradigmáticos na compreensão dos processos comunicativos que estão sendo apresentados via mídia de massa.
A escola enquanto meio de formação leitores e produtores de texto não pode desprezar a riqueza dos gêneros discursivos usados pela mídia, sobretudo, aquela que as informações servem para a manipulação das ideologias capitalista e consumista, elaboradas pelo Estado, tanto nos espaços escolares como nos não escolares. Com efeito, intui-se como perspectiva à construção de uma consciência coletiva na qual os profissionais da linguagem possam, de fato, entender que a tecnologia e a mídia fazem parte do novo cenário educativo e processual da aprendizagem. Os gêneros midiáticos são produções que se hibridizam no universo da informação, dando ao leitor maior oportunidade de interpretação visto que ele [leitor] é fruto da interação de semioses no cotidiano não escolar, onde textos e imagens se coadunam.
Desta forma, o pensamento bakhtineano de gêneros discursivo é destaque ao relacioná-lo aos elementos de significação existentes nas ações dialógicas da linguagem cotidiana dos sujeitos. Na verdade, é nesse contexto que as outras linguagens; escolar e não escolar traduzem o pensamento da sociedade em determinado contexto. Portanto, a linguagem é um processo mental de manifestação do pensamento e de natureza essencialmente consciente, significativa e orientada para o contato interpessoal. Apesar do processo da linguagem ser essencialmente consciente, entretanto entende-se que o fluxo e a articulação provêm de camadas mais profundas do subconsciente e inconsciente.
No estudo da linguagem, deve-se distinguir a expressão verbal e a expressão gráfica e a lingüística se interessa tanto pela linguagem falada quanto pela linguagem escrita. Ambas as expressões são um conjunto de sinais próprios de cada língua com os quais manifestamos nosso pensamento e tanto a expressão verbal quanto à expressão gráfica, devem constar de dois elementos fundamentais - a sintaxe e a palavra.
A sintaxe tem por objeto, segundo Azeredo (2002), as relações entre as palavras e as frases, e corresponde à própria organização do pensamento. As representações e os conceitos devem ser expostos numa determinada ordem necessária à compreensão, formando assim o raciocínio lógico. Portanto, esse arranjo estrutural da linguagem é a sintaxe. Dessa maneira, é importante para o estudante de linguagem perceber que, a palavreado costuma refletir o pensamento e pode ser tida como o elo final da cadeia de processos psíquicos que se iniciam com percepção e terminam com a palavra falada ou escrita. Costuma-se ter por certo que não existem pensamentos que não sejam formulados por palavras, a ponto de poder se afirmar que todo pensamento corresponde a alguma determinada expressão verbal. É por isso que não se estabelecem diferenciações entre as perturbações do pensamento e as alterações da linguagem. Se existissem apenas alterações da linguagem, estas ficariam limitadas aos distúrbios da articulação da palavra e da sintaxe, mas, na realidade, as perturbações da linguagem são muito mais complexas. Se a linguagem é um atributo humano dirigido à comunicação entre pessoas, começamos a considerar o conteúdo da linguagem. Sim, porque os esquizofrênicos podem expressar os maiores disparates delirantes, mantendo uma perfeita correção da sintaxe. Ainda aqui não é demais relembrar que a separação entre os diferentes processos psíquicos é feita apenas para facilitar o ensino.
Diante desse contexto, considera-se, pois, que o trabalho com Gêneros discursivos e diferentes linguagens, especialmente, midiáticas torna-se cada ver mais uma necessidade no processo de ensino-aprendizagem de linguagem na sala de aula das séries iniciais, tendo como foco a leitura e escrita de textos que circulam em ambientes não escolares. Assim, toda atividade com textos de circulação social deve buscar a compreensão da idéia neles contidas através de leitura plena. Para que isso ocorra com certo grau de responsabilidade, é fundamental que o profissional da linguagem promova meios para que o aprendiz faça a imersão em tais ambientes de discurso. Com efeito, à interação com o interlocutor e à participação fique ao cargo do mediador que, nesse caso é o professor.
Dessa forma, os pressupostos da construção das linguagens serão ainda referendados pela gênese e exegese do processo de leitura e escrita. Para isso, visualiza-se que, o estudante de pedagogia pode fazer uma relação dialógica entre as linguagens convencionais (livro didático, literário, ensaio, etc.) e informais (internet, jornais, revistas, outdoors, classificados, folhetos, etc.) como instrumento de desenvolvimento lingüístico, educacional e cultural do seu futuro aluno. Conclui-se ainda que a linguagem é um instrumento mediador da aprendizagem e, portanto, ela se estabelece, nos mais variados espaços de cultura e letramento. Com isso, a utilização dos gêneros discursivos das mídias no fazer cotidiano do aluno e da comunidade, é uma realidade a ser considerada pela escola no sentido de associar teoria e prática de aprendizagem de língua.
Os lingüista e as definições de língua(gem)
Não é difícil de encontrar acepções de língua(gem). Conquanto, algumas sejam mais complexas que outras, vejamos algumas que possibilitam melhor entendimento do profissional das línguas naturais.
a) De acordo com Sapir (1929, p.8) “A linguagem é um método puramente humano e não instintivo de se comunicarem idéias, emoções e desejos por meio de símbolos voluntariamente produtivos.”
b) Bloch e Trager (1942, p5) rubricaram: “Uma língua é um sistema de símbolos vocais arbitrários por meio dos quais um grupo social co-opera.”
c) Hall (1968 p. 158): “a instituição pela qual os humanos se comunicam e interagem uns com os outros por meio de símbolos arbitrários oral-auditivos habitualmente utilizados.”
Referências
LYONS, J. Linguagem e lingüística: uma introdução. São Paulo: LTC, 1981.
MARCONDES, Beatriz; et. ali. Como usar outras linguagens na sala de aula. 4. ed. São Paulo: contexto, 2003.
______, Notas sobre a pós-modernidade: O lugar faz o elo. Rio de Janeiro: Atlântica, 2004.

* Professor de lingüística e linguagens, da UNEB, escritor e poeta.

LITERATURA E ARTE NO HORIZONTE DA PÓS-MODERNIDADE

Robério Pereira Barreto*

Este ensaio busca sintetizar os principais pensamentos sobre a produção literária e artística na atualidade. Porém, antes de adentrar na discussão do fazer artístico-literário que usa os fundamentos da pós-modernidade como elemento estético: forma e conteúdo, fazem-se importante apresentar ao interlocutor, alguns conceitos e, também, opiniões que exploram este tema a partir da semiótica e ciências sociais. Para isso, tal questão está baziladas nos estudos de Eagleton (1998); Harvey (2000); Connor (1996) e outros que apontam em seus estudos os horizontes que a arte no contemporâneo deve tomar. Por isso, concebe que essa estética vai da revolução à transgressão dos padrões clássicos de arte e literatura.
Na verdade, o que se pretende nessa discussão é uma tentativa de apresentar ao leitor o quanto as artes têm criado e até discutido conceitos que, às vezes, vão de encontro com idéias moralizantes, incutidos na sociedade como verdades artísticas até então. Com efeito, tempo e espaço diluíram suas fronteiras e, portanto, para entender melhor esses conceitos que determinam “as práticas de linguagem” no cotidiano da crítica literária, são fundamentais ouvir-se o que diz Eagleton sobre pós-modernidade.

Pós-modernidade é uma linha de pensamento que questiona as noções clássicas de verdade, razão, identidade e objetividade, a idéia de progresso ou emancipação universal, os sistemas únicos, as grandes narrativas ou os fundamentos definitivos de explicação. [...] vê o mundo como contigente, gratuito, diverso, instável, imprevisível, um conjunto de culturas ou interpretações desunificadas gerando um certo grau de ceticismo em relação às indiossincrasias e a coerência de identidades. [...] o mundo efêmero e descentralizado da tecnologia, do consumismo e da indústria cultural, no qual as industrias de serviços, finanças e informação triunfam sobre a produção tradicional, e política clássica de classes cede terreno a uma série difusa de “políticas de identidade” (EAGLETON, 1998, p.07).


De acordo as palavras do crítico americano, a pós-modernidade é, pois, uma forma de pensamento que faz alusões aos discursos do contemporâneo para retratar as crises de tradição. Nesse contexto fica premente a necessidade de trazer à tona o pós-modernismo, como estilo cultural em que se inaugura o uso da linguagem nas narrativas no contemporâneo e que mostram a efemeridade da vida nos grandes centros urbanos. Validamente, ouve-se de novo Eagleton:


Pós-modernismo é um estilo de cultura que reflete um pouco essa mudança memorável por meio de uma arte superficial, descentrada, infundada, auto-reflexiva, divertida, caudatária, eclética e populista, que obscurece as fronteiras ente cultura “elitista” e a cultura “popular”, bem como entre arte e a experiência cotidiana. O quão dominante ou disseminada se mostra essa cultura – se tem acolhimento geral ou constitui apenas um campo restrito da vida contemporânea... (EAGLETON, 1998, p. 07).

Essas formulações acerca da conceituação de pós-modernidade e pós-modernismo reivindicam uma acentuada compreensão de que arte e literatura são instrumentos para a construção de um visual ontológico da sociedade e de suas contradições históricas e culturais. Nessa linha de raciocínio, Connor (1996) discorrendo sobre a posição da ficção e artes no contemporâneo, pondera que


uma ficção pós-moderna, que parece rejeitar a hierarquia, a conclusão narrativa, o desejo de representar o mundo e a autoridade do autor, oferecia a perfeita contraparte de uma critica que enfatizava cada vez mais, de maneira positiva ou negativa, a impossibilidade da representação ou a liberdade de irrestringível do leitor. (CONNOR, 1996, p. 14).


Seguindo a lógica conceitual do pós-modernismo, Connor recorre às metáforas de Charles Newman para afirmar que a obra de arte no contemporâneo tem caráter obscuro. Daí se infere que a cultura e a comunicação artístico-literário na atualidade são representacionais. Assim, Newman chama a atenção para tal estética e, assegurando que, “[...] linguagem crítica e a literária renunciaram deliberadamente a toda relação com um valor de uso confiável e acumulam obscuridade sobre obscuridade em intermináveis espirais de autovalidaçaõ.” (NEWMAN, 1995 apud CONNOR 1996, p. 15).
Dessa maneira, os estudos artístico-literários que objetivam a dissecação dos elementos estruturais, estéticos e significativos da ficção contemporânea, na qual se têm declaradamente a ironia, a tensão da linguagem e a crise de consciência dos sujeitos como objetos de inspiração criativa. É, portanto, aquilo que Connor assevera ser a essência dessa literatura que, na verdade, é a materialidade da linguagem, visto que a ironia e a desconstrução constituem a ficção pós-moderna. Ainda para o estudioso, isso leva à percepção de que a literariedade da narrativa pós-moderna, especialmente, o conto que segundo suas palavras:


[...] estava na intensa capacidade da obra literária de servir de mediadora às qualidades da sua forma e de atrair a atenção sobre esta. [...] a obra de criação literária já não pode ser representada como a humilde subjugação da vontade à tarefa de retratar o mundo nem como conformidade a um corpo de preceitos estéticos; ver o pós-modernismo na literatura como uma quebra ou ruptura; mas, para muitos, a transformação ou avanço pós-moderno pode ser vista como uma intensificação seletiva de certas tendências presentes no próprio modernismo (CONNOR, 1996, pp. 90-92).


Essa observação, envolve valores sociais e, também os princípios da cultura de massa que passaram a ter seus caracteres representados artisticamente pelas metáforas do pós-modernismo. Estes aspectos indicam que descentralização e ironia emanam da obra de criação literária, visto que a lenda do poeta Orpheus se cristaliza a partir da narrativa.
Nesse caso, o conto torna-se um discurso que apresenta os meios pelos quais se compreende a desarticulação deliberada das tradições da literatura pelas gerações de escritores pós-1990, e traz em sua essência dramática o silêncio. Embora tal princípio narrativo siga os passos de Orfeu e continue cantar as crises do cotidiano, mesmo tendo “uma lira sem cordas”.
A esse respeito vê-se que acerca das conotações que o silêncio adquiri na narrativa de ficção pós-moderna, estão as perspectivas da desconstrução dos sentidos clássicos da ficção, as quais, são vistas por Connor assim:


O silêncio tem mais conotações do que a simples ausência de enunciações; a literatura modernista faz a representação teatral de um silêncio “complexo”, que abrange inúmeros sentidos, da recusa à subversão; assim, podemos ver o princípio do silêncio na alienação da razão, sociedade, da natureza e da história, no repúdio e na exploração do êxtase, do transe e de outros estados extremos de sentimento, na concentração da consciência sobre si mesmo, bem como na intensa consciência do apocalipse; o começo da “vontade de desestrutura” modernista nas obras do Marques de Sade, em que “ dialética da transgressão é levada ao infinito”, porque “ o verdadeiro espírito do eu sadiano é a negação priápica e contínua; escritores pós-modernos são igualmente caracterizados pela complexa interação entre desestruturação e recriação heróica; a desintegração “é uma dor que obriga o silêncio a ser fala e a fala a voltar ao silêncio”; “dois sotaques do silêncio”, um negativo, “autodestrutivo, demoníaco, niilista”, outro positivo, “autotranscendente, sacramental e plenário.” (CONNOR, 1996, p. 93).


A narrativa de ficção e as artes pós-modernas gozam de tal espontaneidade porque usam elementos discursivos paradoxais. Portanto, tais ficções se apóiam no cotidiano, porque priorizam temáticas que levam ao inconsciente coletivo flash de realidade. Com efeito, os aspectos formais desse estilo de fazer arte e literatura são baseados em questões como: intertextualidade, androgenia, ironia e esquizofrenia. Estas, na verdade, são consciência estéticas que conduzem à produção pós-moderna em suas contradições.
Em todo esse processo é possível localizar, embora superficialmente os argumentos de Bakhtin, os quais versam a respeito da pluralidade de formas e planos estéticos que formatam a linguagem dos textos narrativos. Portanto, a ficção pós-moderna é para MChale: “um entrelaçamento carnavalesco de estilos, vozes e registros que alegadamente rompe a decorosa hierarquia de gêneros literários”. (CONNOR, 1996, p. 106).


O colapso dos horizontes temporais e a preocupação com a instantaneidade surgiram em parte em decorrência da ênfase contemporânea no campo da produção cultural em eventos, espetáculos, happenings e imagens de mídia. Os produtores culturais aprenderam a explorar e usar novas tecnologias, a mídia, em última análise, as possibilidades multimídia. O efeito, no entanto, é o de reenfatizar e até celebrar as qualidades transitórias da vida moderna. (...) o movimento pós-moderno: o seu relacionamento com a cultura da vida diária e a sua integração nela. (HARVEY, 2000, pp.61-2).


Nas palavras do crítico cultural, há sem dúvida, a crítica à qualidade artística dessas produções. Embora, elas nasçam de um movimento no qual a arte passou a ser objeto de mercantilização, sendo que tal estética é reforçada pela crise dos sujeitos e seus ambientes decadentes. Por isso, a crítica tem sido rígida, quando os observadores são, ou melhor, estão renitentes às mudanças que sofre a arte a partir das alterações promovidas pela sociedade e os meios culturais.
Nesse contexto, torna-se pertinente uma questão. Afinal, ainda há espaço para as grandes narrativas, cujos temas e valores estéticos seguem os princípios clássicos de criação? Não tendo intenção de responder agora este inquérito, espero que ao longo da discussão se evidenciem os argumentos necessários para tal elucidação.
Segundo Harvey (2000), o pós-modernismo pode ser entendido como uma fissura que dá indicativo de rompimento radical a qualquer movimento brusco com o modernismo. Até porque tal estilo informa que a arte, especialmente a literatura, que tem poder revolucionário, isto é, tem em seu bojo a apresentação de sentimentos sociais, no qual o cotidiano é exposto à luz de projetos que vislumbram a liberdade individual. Com efeito, Harvey diz que:


o pós-modernismo tem um potencial revolucionário em virtude de sua oposição a todas as formas de metanarrativa (incluindo o marxismo, o freudismo e todas as modalidades de razão iluminista) e da sua estreita atenção a “outros mundos” e “outras vozes” que há muito estavam silenciados ( mulheres, gays, negros, povos colonizados com sua história própria). (HARVEY, 2000, pp.47).


Dessa maneira, as narrativas de caráter pós-moderno, especialmente o conto, têm uma estrutura narrativa que, segundo Lyotard é um labirinto, ou seja, nelas há jogos de linguagem nos quais os significados ganham amplitude interpretativa. Eis, portanto, uma das características que as inserem no estilo pós-modernista. Por isso, Harvey auxilia mais uma vez citando Foucault: “desenvolver a ação, o pensamento e os desejos através da proliferação, da justaposição e da disjunção e a proferir o que é positivo e múltiplo, a diferença à uniformidade, os fluxos às unidades, os arranjos móveis aos sistemas. (FOUCAULT, 1983: xiii apud HARVEY, 2000, pp.49).
Diante disso, a literatura pós-moderna tem sido objeto de polêmicas daqueles que se mantêm resistentes às novas criações narrativas. No entanto, os autores mostram–se alheios às assertivas da crítica institucional, até porque, a maioria não apresenta interesse em ter seu nome no cânone literário nacional, pois suas produções se voltam para a estética da desconstrução. Assim, Derrida entende que isso resulta em “quebrar a continuidade ou linearidade do discurso, e leva necessariamente a uma dupla leitura: a do fragmento percebido com relação ao seu texto de origem; a do fragmento incorporado a um novo todo, a uma totalidade distinta.
De acordo com Perrone-Moisés (1998) para que tais narrativas possam ter a “permanência dos grandes nomes do cânone ocidental, no campo da edição e da difusão, deve-se a múltiplos fatores; um desses fatores foi o empenho dos escritores-críticos modernos em mantê-los presentes nos debates literários, e em comunicá-los aos mais jovens” (PERRONE-MOISÉS, 1998, pp. 174-75). Com efeito, no cânone nacional temos escritores críticos que se mostram, de certo modo, adeptos da estética pós-moderna tais como: Afonso Romano de Sant’Anna, Ferreira Gullar, Dalton Trevisan, Nelson de Oliveira, Lucinda Persona e Joça Reiners.
Esta questão ganha simetria a partir da idéia de que na sociedade de leitores apressados e de vida pós-moderna é preciso que se produza uma literatura que venha ao encontro de tais necessidades, visto que os leitores, no pós-modernismo não têm “tempo” para fazer leitura de textos cujas temáticas e tiradas filosóficas, sociológicas e moralizantes são demasiado longas. Ao contrário, eles facilmente aderem às poéticas de recortes e colagens de produções já canonizadas, vivenciando assim uma literatura intertextualizada.
Sobre essa questão Derrida relata que nesta perspectiva a linguagem, especialmente, aquela que é empregada como estética pós-modenista tem possibilitado a explicação da esquizofrenia que faz parte da vida do homem na atualidade. “A nossa sociedade produz esquizofrênicos da mesma maneira como produz o xampu Prell ou carro Ford, com a única diferença de que os esquizofrênicos não são vendáveis.” (DERRIDA, 2000, p. 15). Por isso, a releitura dessas questões, às vezes, pode tornar as obras que primam por essa estética, canônicas em virtude da desmitificação da ideologia construída no corpo social da linguagem literária clássica e, também por ter caído no gosto de leito e critica, sendo que o crítico mais importante é o leitor incauto.
Nesse sentido, os poetas pós-modernos levados pela gama de acontecimento e mundanças políticas, sociais e sexuais no ritmo da sociedade atual, vêm a atender a este chamado, muitas vezes sem muita preocupação com a posição da crítica institucional. Conforme assegura Perrone-Moisés:


Os novos escritores não estão nem um pouco interessados em ingressar futuramente no cânone; interessa-lhes ter seus livros rapidamente publicados, traduzidos em línguas hegemônicas, adaptados para o cinema e a televisão; para conseguir esses objetivos, não é necessário ‘um longo assentimento’, basta figurar na lista dos mais vendidos. (...) Quanto aos leitores de literatura, em geral esses se interessam pouco por discussões acadêmicas, embora delas dependa, pelos menos em parte, a existência futura de leitores de literatura. (PERRONE-MOISÉS, 1998, p. 176).


Na realidade, as poéticas pós-modernas oscilam ente colagem e montagem do cotidiano, mantendo em sua ordem discursiva a obscuridade, ironia e confusão de temas.


... citar, pastichar ou reciclar, com uma vaga ironia desprovida de qualquer projeto, (...) A arte moderna, que surgira com escândalo, em ruptura com o público, está por toda parte. (...) A literatura, que durante séculos ocupara um papel relevante na vida social, tornou-se cada vez menos importante. Na “sociedade do espetáculo” (Guy Debord), a escrita literária fica confinada a um espaço restrito na mídia, pelo fato de se prestar pouco à espetacularização. (PERRONE-MOISÉS, 1998, p.177).


Assim torna-se visível a disposição dos poetas em fazer uso do estilo pós-moderno, o qual privilegia as produções que reificam os discursos das fontes, trazendo à tona processos poéticos que se caracterizam pela transgressão tanto origem quanto da influência. Atualmente, há produções narrativas que atendem a estética da violência, ou seja, poetas e escritores pós-modernos organizam sues textos em torno de acontecimentos sociais que representam tragédias pessoais e coletivas que vão além da catarse clássica. Tal procedimento estético pode ser entendido como uma aceitação dos padrões determinados pela indústria cultural.
Sob esse ponto de vista, Adorno em sua Teoria da Estética, responde aos ataques de seus críticos, afirmando que a arte depois do holocausto deveria levar em conta aspectos estéticos e culturais impingidos pelos sistemas dominantes, mas nem por isso, a arte deveria desprezar as barbáries e produzir trabalhos simplistas que agradariam a paladares superficiais de leitores incautos.


A violência que há cinqüenta anos podia parecer legítima àqueles que nutrissem a esperança abstrata e a ilusão de uma transformação total está, após a experiência do nazismo e do horror estalinista, inexplicavelmente imbricada naquilo que deveria ser modificada: “ou a humanidade renuncia à violência da lei de talião, ou a pretendida práxis política radical renova o terror do passado. (ADORNO, s.d., p.11)


Dessa forma, percebe-se que a produção artística que tem como práxis o relato dos mecanismos de dominação social, impingidos pelo sistema dominante: violência física e psicológica; tortura ;cessão de direitos sociais; crise de identidade e sexual é defendida por Adorno.
Os ataques da crítica literária pós-moderna fazem com que a obra de arte, nesse caso a narrativa, tenha sua essência discursiva voltada para a exposição de pensamentos epistemológicos.
A obra de arte nesse contexto, segundo afirmou Adorno, tem papel duplamente definido, ou seja, ao mesmo tempo em que representa as antíteses e aninomias da sociedade, ela em si mesma é u duplo, pois detém em seu bojo uma relação triádica com o público consumidor.


Esse duplo caráter vincula-se à própria natureza desdobrada da arte, que se constitui como aparência. Ela é aparência por sua diferença em relação à realidade, pelo caráter da realidade que pretende retratar, pelo caráter aparente do espírito do qual ela é uma manifestação; a arte é até mesmo aparência de si própria na medida em que pretende ser o que não pode ser: algo perfeito num mundo imperfeito, por se apresentar como um ente definitivo, quando na verdade é algo feito e tornado como é. (ADORNO, s.d., p. 11).


Após esse arcabouço teórico-meotodológico faz-se breve análise de Até parece de mentira, de Lucinda Persona. Este conto foi publicado na revista RDM, 2004, p. 34. Desse corpus analisar-se-ão elementos recorrentes da narrativa pós-moderna conforme anunciando acima. É, pois, uma narrativa com temática atual e se aproxima do cotidiano, apresentando assim as relações entre o sujeito e o meio social no qual ele vive.
Persona narra o drama que faz parte do cotidiano nas cidades pós-modernas, isto é, apresenta no referido conto um encontro amoroso, no qual as personagens mostram o conflito existencial e saem em busca de algo que lhes completem. Sendo assim, ouve-se o que diz o narrador sobre si mesmo: “vigilante, cautelosa, ela entrou no carro que, pelas mãos dele, arrancou suave no meio da noite. Uma animadora lua se erquia no céu com um leve tom de amarelo e prata” (PERSONA, 2004, p. 34).
Tem-se ai uma atmosfera romantizada, isto é, a figura feminina se mostra deslumbrada diante do que se passa. Embora saiba que tudo não passa de mais uma aventura. Tais ocorrências remetem ao universo intertextual, pois, aludem à inocência da mocinha pura diante do príncipe encantado e que tem a lua como espectadora. Tem-se assim, um texto recorrente do romantismo.
As palavras do narrador indicam que a protagonista já conhecia o ambiente onde tinha sido “encontrada”, porém algo lhe dizia aquele seria o dia: quantas e quantas noites ela já estivera naquele quarteirão, esperando, toda cheia de adereços, despojada de pudores. Que se danasse o mundo, ela havia escolhido seu destino, estava de bem com o que era e com o que fazia.” (PERSONA, 2004, p. 34).
Na perspectiva da estética pós-moderna em tal narrativa se vislumbra o entendimento de que a autora usou de elementos que levam à concepção da crise de identidade, pela qual passa a personagem protagonista, até porque em toda narrativa os agentes não são identificados, apenas são apresentados pelos pronomes Ele e Ela. Com efeito, tem-se nessa narrativa uma presença significativa do silêncio que, segundo já mencionado por Connor, faz parte da estética da ficção pós-moderna e, portanto, tem no silêncio o princípio “da alienação da razão, da sociedade, da natureza e da história, no repúdio e na subversão da linguagem, [...] na exploração do êxtase, do transe e de outros estados extremos de sentimento, na concentração da consciência sobre si mesmo, bem como na intensa consciência do apocalipse.” (CONNOR, 1996, p.93).
Sob outro enfoque, ainda é possível perceber a efemeridade dos relacionamentos humanos, uma vez que tudo está baseado na busca imediata do prazer hedonista. Para tanto, comprova-se isso nas afirmações que seguem:


Finalmente, o lugar ideal. Rápido drinque, cama. Ela ainda vestida, caiu nos braços dele. Súbito, ele, numa atitude quase drástica, indo às vias de fato, virou-a numa posição que todos de cunho... marcadamente animal. Ela bem diversa, em seu consentimento ativa, já apaixonada, esgoeleou-se em muitos ohs! E, numa outra manobra, quando ele descobriu já era tarde. (PERSONA, 2004, p. 34).


Verifica-se que nessa narração há também a presença da androgenia como elemento temático. “de início, inerte, depois, possesso, como os enganados se sentem, virou-a de frente, deu-lhe um soco no queixo (nem tão forte assim) esbravejando: “porra de travestis! E se foi.”” (PERSONA, 2004, p. 34).
Viram-se nesse percurso alguns aspectos que compõem, atualmente, a narrativa de ficção pós-moderna. Logo, a compreensão e análise da literatura e da arte contemporâneas, sobretudo a ficção de caráter pós-moderno está edificada no fragmentário, no andrógino e no efêmero.
Referências
BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
CONNOR, Steven. Cultura pós-moderna. 3.ed. São Paulo: Loyola, 1996.
EAGELTON, Terry. As ilusões do pós-modernismo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
HARVEY, David. A condição pós-moderna. São Paulo, Loyola, 1998.
PERSONA, Lucinda. Ate parece de mentira. In. Revista RDM, Cuiabá, 2004, p.34.
SARLO, Beatriz. Paisagens imaginárias. São Paulo: Edusp, 1997.
_____, cenas da vida pós-moderna: : intelectuais, arte e videocultura na Argentina. 2. ed. Rio de Janeiro, Editora UFRJ, 2000.
SANTAELLA, Lúcia. Arte & (cultura):equívocos do elitismo. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1995.
* Professor da Uneb – Campus XVI Irecê - BA.