domingo, 13 de setembro de 2009

O SILÊNCIO E A REIFICAÇÃO DO CORPO FEMININO

Este trabalho tem como objetivo visualizar o silêncio e a reificação do corpo feminino, em 234 contos – Dalton Trevisan -, buscando destacar o poder masculino empreendido no discurso direto dos personagens masculinos
Escrever sobre o silêncio é uma tarefa que apresenta de imediato dificuldades, sobretudo, quando a escrita está relacionada com o texto literário, sendo que a linguagem literária, sustenta-se num sistema semiótico secundário, o qual busca afirmação para o significante no sistema lingüístico. Logo, é licito dizer que é a partir desse entendimento que se constrói os discursos literários numa perspectiva de conotação. Se entendermos que o silêncio, também é um tipo de expressão/discurso e que tem certo grau de conotação, sem dúvida, a contribuição de Lefebvre sobre o conceito de conotação corrobora de maneira magistral para a compreensão das nuances que subjazem o silêncio que torna o corpo feminino das personagens de Trevisan algo reificado no texto literário.
Uma verdadeira conotação só se manifesta quando a palavra é empregada precisamente por oposição à palavra corrente’flingue’ é calão e reenvia, por isso, a um certo meio social. Parece, pois, que o termo conotação deve ser reservado para sentidos de uma palavra ou de uma expressão que podem existir virtualmente na experiência que temos da coisa designada por essa palavra, ou nas associações que nascem do uso que se faz dessa palavra (ou expressão) na linguagem em geral, ma que só se actualizam pelo seu emprego particular num certo discurso. A conotação é um sentido que só advém à palavra numa dada situação e por referência a um certo contexto (de linguagem ou vivido) .
Dessa maneira, convém deixar claro que, tomo o silencio como uma forma de discurso que, certamente provoca reflexão, de qualquer maneira, crê que seja interessante dizer já de imediato que a premissa básica para o desenvolvimento desse trabalho é a observação das marcas que o silencio deixa no discurso do texto literário moderno. Todavia, convém afirmar que tal procedimento será realizado a partir da análise dos contos de 234, de Dalton Trevisan, que em seu bojo tem uma série de expressões discursivas que conotam ideologias que não são completadas pela linguagem verbal.
“há uma dimensão do silêncio que remete ao caráter de incompletude da linguagem: todo dizer é uma relação fundamental como não dizer. O silêncio é assim a “respiração” (o fôlego) da significação; um lugar de recuo necessário para que se possa significar, para que o sentido faça sentido. Reduto do possível, do múltiplo, o silêncio abre espaço para o que não é “um”, para o que permite o movimento. O silêncio como horizonte, como iminência do sentido...” (ORLANDI, 1997, 12-13).
As relações discursivas criadas na narrativa de ficção contemporâneas têm movimentado uma série de estudos, despertando assim o interesse da crítica e dos estudiosos. Todavia, isso não é gratuito, pois os debates atinentes, a questão sígnica do silencio no discurso literário, tem de tal modo considerado esta marca lingüística como uma forma de expressão.
No plano lingüístico, este evento leva-nos a velha polêmica da filiação teórica, isto é, o signo lingüístico é interpretado de maneiras diferentes, de forma que a Semiótica e a Analise do Discurso tem realizado ações conflitivas quando das observações das marcas que configuram o silencio. Se aceitarmos a idéia de que a teoria da análise do discurso, certamente parte para o porto que leva a inferência de que somos resultado dos discursos apreendidos ao longo de nossa existência, em contrapartida temos a Semiótica e o Estruturalismo Lingüístico que nos remete ao pensamento de que todo signo tem uma função ideologia, estando implícita ou não na construção discursiva.
Entendendo que este estudo deve pauta-se numa teoria, elegemos para tal fim a teoria de Bakhtin, destacando a linha que dá conta da interação verbal, cujo cerne é o pensamento filosófico - linguístico que liga os discursos literários.
Este trabalho visa argumentar e colocar em discussão alguns pontos que marcam o processo narrativo de Dalton Trevisan, de maneira que a eleição da obra 234, dar-se em virtude da configuração do espaço discursivo empreendido na narrativa, de tal maneira que o autor realiza o discurso em uma linha seqüencial, possibilitando assim a diluição do silencio num contexto altamente contrastivo, isto é, de um lado a cultura machista – poderosa, imponente - de outro a feminina, submissa e quase imperceptível na fala do narrador, concretizando assim o pensamento bahktiniano que afirma:
“O subjetivismo individualista apóia-se também sobre a enunciação monológica como ponto de partida da sua reflexão sobre a língua. É verdade que seus representantes não abordaram a enunciação monológica do ponto de vista do filólogo de compreensão passiva, mas sim de dentro, do ponto de vista da pessoa que fala, exprimindo-se.
Assim sendo, busca-se sustentação teórica nas observações dos estudos semiológicos realizados pelos membros do círculo de Bakhtin, o que conseqüentemente, levará aos estudos da análise do discurso, pois o texto de Trevisan está carregado de símbolos, inclusive o silêncio, que está configurado nas marcas lingüísticas. Dessa maneira, é lícito que se transite também nas idéias de Roland Barthes y Pêcheux, que certamente nos orientará sobre os processos lingüísticos que subjazem a questão do silencio no discurso literário.
Entende-se que o silêncio é uma forma de expressão, de modo que o discurso empreendido por Trevisan na obra em questão, situa-se num ponto nefrálgico deste trabalho, de tal maneira que o texto em estudos está repleto de pontos em que se apresenta a submissão da mulher. Com efeito, registra-se isso com maior vigor nos contos em que as personagens femininas ouvem os discursos dos personagens masculinas sem fazer contestação.
No plano filosófico e, sobretudo, ideológico da linguagem Bakhtin (1997:31-38) corrobora ao afirma que “um produto ideológico faz parte de uma realidade (natural ou social) como todo corpo físico, instrumento de produção ou produto de consumo; mas, ao contrário destes, ele também reflete e refrata outra realidade, que lhe é exterior. Tudo que é ideológico possui um significado e remete a algo situado fora de si mesmo. [...] tudo que é ideológico é um signo. Sem signo não existe ideologia.”
Neste caso, é possível perceber que o silêncio em um discurso carregado de pausa como o existente em 234 leva-nos a inferir que tal atitude narrativa é uma forma ideológica, em que está implícito todo poder de uma cultura baseada nos mandamentos machistas. Todavia, as personagens femininas agem de maneira silenciosa, possibilitando uma ação dissimulada dos episódios que estão presentes na estrutura discursiva dos personagens masculinas.
Partindo de um pressuposto filosófico, sobretudo no que se refere ao processo condenativo empreendido pelos personagens masculinos contras as femininas dos contos em estudos, poder-se-ia dizer que Foucault (1987), estabelece este tipo de castigo como sendo o resultado de um no código corretivo, no qual “as punições estão menos diretamente físicas, certa discrição na arte de fazer sofrer, um arranjo de sofrimento mais sutis, mais velados e despojados de ostentanção.”
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
BACCEGA, Aparecida Maria. Palavra e discurso: história e literatura. 2. ed. São Paulo, Ática, 2000.
FOUCAULT, M. História da sexualidade I: vontade de saber. Trad. Maria Thereza da Costa Albuquerque e J. A Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1990.
LEFEBVE, Jean-Maurice. Estrutura do discurso da poesia e da narrativa. Coimbra, Livraria Almedina, 1980.
ORLANDI, Eni Puccinelli. As formas do silêncio: no movimento dos sentidos. 4. ed. Campinas, Editora da UNICAMP, 1997.
TREVISAN, Dalton. 234 contos, Rio de Janeiro: Record, 1997.
WALDMAN, Berta. Do vampiro ao cafajeste: uma leitura da obra de Dalton Trevisan. 2. ed., São Paulo, Hucitec, 1989.

OLHOS QUE NOS FAZEM DESEJAR: HIPERMÍDIA

Pensar a posição do homem contemporâneo ante ao universo de informação via imagem é, sobretudo, recordar o nascimento das tecnologias inteligentes criadas nos séculos precedentes à era da comunicação eletrônica, a qual revolucionou a pragmática da comunicação moderna. Com isso, Pierre Lévy conduz nosso pensamento àquilo que chama de terceiro pólo do espírito, isto é, o pólo informático-mediático.
Nesse nível de comunicação, segundo o filosofo francês, isso acontece numa espécie de continuum em que vontades e desejos são compartilhados por mensagens a partir das imagens elaboradas e veiculadas no hipertexto; TV onde os diálogos são formatados por meio de imagens, criando dessa maneira no cognitivo do leitor-espectador, imaginações e fetiches (o que aparece na mídia, especialmente na TV existe, posto que ao contrário não acontece.).
Diante disso, “atores da comunicação conectados a uma rede, dividindo um mesmo hipertexto, numa relação totalmente nova com os conceitos de contexto, de espaço e de tempo das mensagens.” São, aqui o que veremos como noção cronológica normalmente empregada para delimitar o tempo do discurso, seja verbal ou visual é contestada. Assim Lévy nos assegura a existência da velocidade pura, pois as barreiras do tempo linear das narrativas são quebradas graças a “pluralidade de devires imediatos” trazidos pelas imagens que, instantaneamente levam o leitor-usuário a desejar e escolher a melhor imagem que a priori preenche suas necessidades imediatas.
A hipermídia é, portanto, olhos que fazem o leitor desejar e, talvez trazer à tona suas fantasias e imaginações. Para Boff esse acontecimento é a transformação em que todos desejam passar, ou seja, os espectadores sonham em se transforma em seres importantes a partir da inserção de sua imagem na hipermídia a tal ponto de verem suas identidades modificadas.
A imagem segundo o teólogo, na sociedade contemporânea ganha status de identidade e afirma: “E a identidade de uma pessoa é mais e mais a imagem que se projeta dela para os outros e menos o que ela é em si mesma em sua profundidade, em sua dialogaçao consigo e com seu universo interior e exterior. Ou se participa efetivamente desse tipo de sociedade-espetáculo, sendo um ator real, ou se participa pelo imaginário e pela imagem.” Como exemplificação do que mostrar Boff, historicamente Orwell apresentou em seu livro 1984 a sociedade do espetáculo que, segundo o ambiente da narrativa era a sociedade soviética que vivia o caos das perseguições da política arbitrária do comunismo. Atualmente, em versão pós-moderna eis que a TV Globo nos últimos cinco anos vem apresentando e construindo identidades em seu reality Show Big Brother Brasil, no qual milhões de pessoas se vêm representadas por personagens imaginárias criadas por produtores e roteiristas. Por isso, explicitaremos nessa comunicação os conceitos e implicações que comunicação na hipermídia conduz seus usuários diariamente.

ASSIM ACONTECE A COMUNICAÇÃO NA MÍDIA INFORMAL

A Carnavalização na Linguagem nas Mídias de Rua



As normas são sempre abstrações, rígidas fórmulas provisórias que não podem aspirar a incluir as ilimitadas possibilidades do ser.  Ortega y Gasset¨



Introdução


Este texto articula-se em torno da temática: desvios da norma na escrita em mídias de rua: cartazes, anúncios e placas que promovem à comunicação social, econômica e cultural dos usuários e produtores de mídias populares.



Embora neste material não se respeite os ditames da gramática normativa, há intencionalidade comunicativa, de modo que, os cidadãos conseguem realizar diálogos interagindo significativamente no e com mundo. A partir desta compreensão inicia-se o diálogo entre a Análise do discurso (AD) e a teoria bakhtiniana da carnavalização[1], a qual é empregada nos textos publicitários expostos em placas e letreiros nas vias públicas das periferias bem como em sítios eletrônicos especializados em receber e armazenar tal produção discursiva. Com efeito, recorrer-se-á às mensagens postadas no sitio http://www.placariduculas.com.br/ as quais serão analisadas de acordo com a cena enunciativa proposta pelo anúncio, levando-se em conta que tais discursos não apresentam autoria definida, por isso, atribuir-se-á tal domínio ao espaço publico onde estão armazenadas.



Antes, porém, faz-se necessário afirmar que, a teoria conduzirá a uma metodologia, portanto, a priori travar-se-á um diálogo com os teóricos do assunto na tentativa de melhor clarificar conceitos e afirmações sobre a carnavalização da linguagem e mídias escritas para, a posteriori se iniciar a análise sistemática do corpus que, neste caso se trata da linguagem usada na mídia de rua, a qual se caracteriza como contra ponto da linguagem formal. Isto é, na mídia de rua é representada pela a liberdade de ação e de linguagem do homem com o mundo e consigo mesmo, a cosmovisão carnavalesca expõe-se considerando categorias e particularidades do gênero cômico-sério, tais como: o livre contato familiar entre os homens, afirmando que essa proximidade, desconsidera quaisquer barreiras financeiras ou sociais, antes intransponíveis; a familiarização, ou seja, a livre relação familiar, que permite a união de valores antagônicos, combinando-os: o sagrado com o profano, o grandioso com o insignificante; a aproximação de heróis, mitos, personagens históricos da nossa realidade: há em nosso convívio diário, uma aproximação familiar com seres, antes inatingíveis; não se baseia em lendas e nem se consagra através delas, mas sim na fantasia livre e, na maior parte dos casos, o tratamento a lendas e mitos é crítico.



Desse modo, retomar-se-ão algumas considerações a respeito da gênese da linguagem, tendo, pois, como referência as correntes judaico-cristãs as quais tomaram a produção da língua (gem)[2] sob os princípios da ordem do discursos religiosos, e a greco-latina, a quem a civilização ocidental deve os primeiros atos racionais tanto na literatura quanto na ciência. Com isso, o caminho percorrido por este texto é, íngreme e, portanto, ocorrerão avanços e digressões, cabendo ao leitor acompanhar cada passo que se dará a frente, bem como aqueles que ficarão em suspensão ao longo da caminhada.



O português do povo[3] ocupará neste trabalho lugar de conflito para demonstrar que a forma como a escola oferece a língua portuguesa ao estudante, na atualidade, é inócua e impraticável no cotidiano, haja vista a prática das mídias escrita nas ruas: faixa, letreiros, cartazes na qual há consideráveis desvios da norma padrão, porém tal produção lingüística não deixa de ser parte do idioma nacional.



2. O idioma do povo no cotidiano



Sabe-se que os babilônios legaram aos ocidentais o alfabeto e boa parte das terminologias que descreve os mecanismos das línguas. Para Sócrates (470/469-369 a. C) a palavra é ação, faz agir, dirigir, porém quando não é bem usado engana. Por isso, diz-se que Zeus, o deus soberano do Olimpo, falava e agia eficazmente. Assim sendo, a língua (gem) serve à persuasão do homem, ser político por natureza.



Para Aristóteles (384-322 a.C) as palavras são construções dos homens e não uma imitação (mímesis) do objeto nomeado. Nesse sentido, o idioma usado pelo homem do povo em seu cotidiano vai ao encontro de suas necessidades comunicativas. Dessa maneira, segundo Leite (2004, p.17), Rousseau tratou dessa questão no Ensaio sobre a origem das línguas (texto póstumo) afirmando que:



A motivação para a linguagem humana vem da necessidade de comunicação, uma vez que os homens constituem uma sociedade. E o homem pode comunicar-se pelo movimento corporal (o gesto) ou pela vocalização (a palavra). É a linguagem como convenção que distingue o homem dos demais animais [...] A comunicação pode até se dar sem palavras. O silêncio é, às vezes, mais eloqüente do que a argumentação bem engendrada. (LEITE, 2004, p.17).



Embora seja complexa a concepção de Rousseau sobre a linguagem, tira-se dela a idéia de que à medida que o povo evolui em suas maneiras de se relacionar na vida social, política, cultural e econômica cria instrumentos próprios de comunicação, privilegiando, às vezes, a oralização da língua (gem) mesmo em espaço de escrita. (ver-se tal questão a seguir). Yonne Leite (2004) interpretando o pensamento de Rousseau diz que depois que o homem transcendeu os limites da família no que se refere às relações sociais, construiu para si e os demais, leis lingüísticas as quais foram aperfeiçoadas com o uso contextualizado. Por isso ela nos informa que:



O homem, porém, possui um privilégio: o de ter em sua própria essência a possibilidade, pronta a se realizar, de sair do estado de natureza e desenvolver línguas de convenção ou línguas adquiridas em sociedade. As primeiras palavras livres do condicionamento das necessidades físicas, portanto, foram motivadas exclusivamente pelo sentimento e pelas necessidades morais. (LEITE, 2004, p.19).



A linguagem como se sabe é o meio pelo qual o ser humano consegue expressar-se, defender suas idéias, enfim, interagir com o outro. Por esse motivo, cabe à escola proporcionar o maior número de situações em que o aprendiz a utilize significativamente, garantindo-lhe os conhecimentos necessários para que possa participar plenamente da sociedade.

Para Travaglia a linguagem “é um lugar de interação humana, de interação comunicativa pela produção de efeitos de sentido entre interlocutores, em uma dada situação de comunicação e em um contexto sócio-histórico e ideológico”. (2006, p. 27). Também de acordo com Chauí “a linguagem é nossa via de acesso ao mundo e ao pensamento, ela nos envolve e nos habita, assim como a envolvemos e a habitamos”. (2002, p. 147). Assim sendo, é através das atividades da linguagem que o homem se constitui sujeito, só por intermédio delas é que tem condições de refletir sobre si mesmo.



Em relação à variação lingüística, a única aceita como correta no espaço escolar até a década de 70, era a norma culta. Sobretudo, desconsiderava-se a linguagem própria de cada indivíduo, oriunda do grupo social ao qual ele pertencia e enfatizava a questão do preconceito no que se refere a considerar uma variação ‘certa’ e outra ‘errada’, uma ‘melhor’ e outra ‘pior’. Nota-se que essa maneira de encarar o ensino da língua materna levava o aprendiz a ficar traumatizado psicologicamente, além de se sentir rebaixado por não saber falar ‘certo’. Percebe-se, pois, que nestes contextos os estudos da sociolingüística trouxeram enormes contribuições, permitindo repensar o lugar das variantes lingüísticas no ensino da língua e, assim, combater os preconceitos contra as diversas modalidades de expressão oral dos alunos, abrindo um espaço para a valorização das diferenças, além de reformular a noção de erro, o que é muito importante.



A evolução da língua (gem) se quer vê-la a partir da racionalidade de suas estruturas, basta, portanto, compreender o que propôs Rousseau “língua, sociedade e desigualdade são aquisições tardias e estão estreitamente ligadas.” Nesse sentido, o português brasileiro “a última flor do Lácio, inculta e bela”, está carrega de oralização, tornando-se, às vezes, onomatopaica. O que se ver nas ruas, portanto, é uma produção lingüística heterogênea que possui uma séria de sinônimos, palavras abstratas, aumentativos e diminutivos, nos quais sobressaem irregularidades e anomalias típicas da comunicação inter-humana.



De acordo com Leite (2004) este processo leva ao reconhecimento de que na língua(gem) há elevado grau de diversidade, esta, pois é resultante das migrações, em época diferente, de população que outrora habitavam um mesmo território.



“E há línguas que têm, hoje, apenas uns poucos falantes, como, no Brasil [...] A linguagem humana, em seus componentes físicos e mentais, não é igual a nenhum outro tipo de linguagem animal conhecida, embora diversas espécies apresentem sistemas de comunicação bastante desenvolvidos, (Leite, 2004, p. 38).



O desenvolvimento da linguagem aconteceu ao que tudo indica, no momento em que as relações sociais entre os homens se tornaram mais complexas, sendo impossível, separar o indivíduo com suas capacidades físicas e biológicas de sua relação com o contexto social do qual faz parte. Essa nova abordagem procura compreender o surgimento da linguagem em função da vida em sociedade. (Leite, 2004, p. 40).



3. Enunciando o contexto na mídia de rua

As mensagens propostas pelos enunciadores que produzem, a seu modo, a comunicação na mídia de rua com intuito de marcar processos locutivos que, direto ou indiretamente represente os contextos nos quais se justapõem seqüências de sons e imagens. Para Maingueneau (2005, p. 19) “cada enunciado é portador de um sentido estável, a saber, aquele que lhe foi conferido pelo locutor. Esse mesmo sentido seria decifrado por um receptor que dispõe do mesmo código, que fala a mesma língua.” Assim sendo, pode-se inferir que, as mensagens, fruto desse procedimento discursivo, são, de algum modo, o reflexo das educações circulantes nos espaços sociais. Assim sendo, e à maneira de Maingueneau, a atividade lingüística recorrente neste continuum serve como determinante de uma realidade sociocultural, isto é, as peças publicitárias representam a emergência da comunicação do enunciador.



A produção discursiva da mídia de rua lança mão de um português “particular”, isto é, nela se encontram elementos assimétricos da língua cotidiana a qual pede emergência no ato comunicativa; fato que impede ao enunciador reflexão sobre o uso adequado da língua. Portanto, produzir e interpretar estes enunciados exige flexibilidade, por que a situação em que são realizados determinam o processo lingüístico. Ainda segundo Maingueneau (2005, p. 19-20), a compreensão de “um enunciado não é somente referir-se a uma gramática e a um dicionário, é mobilizar saberes muito diversos, fazer hipóteses, raciocinar, construindo um contexto que não é um dado preestabelecido e estável.”



Conforme discurso da figura 1, o enunciador oraliza a escrita e, portanto, desvia o enunciado do paradigma gramatical, grafando com “x” o verbo “fechar”; fexe o portão” e o verbo “fazer” com “s”: fas favor. Diz-se, portanto que neste exemplo evidencia-se a oralidade em detrimento da escrita. Com efeito, falar altera a relação entre os movimentos inspiratórios e suspende-se o início da fase do movimento inspiratório [...] o condicionamento da linguagem ao contexto cultural e à pragmática comunicativa, enfim, aos fatores que condicionam a execução, como limitação de memória, tempo e estratégias de processamento, acessibilidade ao contexto cultural compartilhado” (Leite, 2004, p. 48).



Além destas questões fonéticas e gramaticais, ficam subentendidos o nível sociocultural produtor do discurso, uma vez que o contexto em que se enuncia a sentença é desprovido de quaisquer indícios que levem o interprete a inferir que se trata de um escrevedor competente.

A linguagem humana possui algo qualitativamente diferente, sobretudo no que diz respeito a sua rica e infinita capacidade de criação de sentenças. [...] a faculdade da linguagem é uma adaptação extremamente complexa, que foi sujeita às leis da seleção natural na história evolutiva humana recente, servindo à função de comunicação com extrema efetividade. (Leite, 2004, p. 43).



Se se quer uma realização lingüística de acordo com as sentenças propostas pela norma culta, levar-se-á em consideração o que Leite (2004, p.45) asserta: “a aquisição da linguagem é natural e se manifesta graças à exposição a dados lingüísticos suficientes num período determinado da maturação do indivíduo.” Logo, percebe-se que o enunciador promotor da mensagem citada na figura 1 não cumpriu tal ciclo, podendo até ter sido exposto a elementos lingüísticos, contudo, não teve maturação suficiente para tal, visto que sua produção é baseada apenas em empirismo de fala. Dizendo de outro modo, tal enunciado está sob a égide da fala, isto é, da maneira que se produz o som se escreveu.

Considerações (quase finais)



Face à dimensão da problemática da escrita da usada na mídia de rua, infere-se que, as escolas não estão dando conta de formar usuários competentes para o uso sistemático da língua. Com isso, acredita-se que há duas línguas sendo usada pela comunidade: a) a língua da escola é ofertada sob a perspectiva da consolidação da norma padrão, reservada àqueles se pretende atender as necessidades da elite; b) uma língua do homem do povo o qual produz enunciados cuja significação vai além da ordem lingüística, isto é, quando o se produz discurso nas mídias de rua, prima-se pela comunicação imediata. Ou seja, o enunciador não se detém em normas, mas sim na emergência de enunciar um acontecimento.



Referências

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 12256: Apresentação de originais. Rio de Janeiro: ABNT, 1992.

_____________NBR 6023: Informação e Documentação - Referências - Elaboração. Rio de Janeiro: ABNT, 2002.

_____________ NBR 6028. Apresentação de resumo. Rio de Janeiro: ABNT, 2002.

BAKHTIN, Mikail. Problemas da poética de Dostooiévski. 2. ed. Rio de Janeiro: 1997.

_________ Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 2000.

_________ Cultura popular na idade média. São Paulo: Hucitec, 2000.

FÁVERO, Leonor Lopes; KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. Lingüística textual: introdução. São Paulo: Cortez, 1983.

ILARI, Rodolfo. A lingüística e o ensino da língua portuguesa. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça; TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Texto e coerência. São Paulo: Cortez, 1989.

MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2004.

TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática e interação: uma proposta para o ensino da gramática. São Paulo: Cortez, 2006.

WEEDWOOD, Bárbara. História concisa da lingüística. São Paulo: Parábola editorial, 2002.


¨ Apud Leite (1999:38).

[1] Mikhail Bakhtin, filósofo russo, estudioso de literatura e da linguagem. Criador da teoria da Carnavalização. A Teoria da Carnavalização é composta por quatro elementos: a inversão, excentricidade, familiarização e profanação. Sendo a principal delas a Profanação. Assim, as restrições, leis e proibições, que sustentam o sistema e a ordem da vida comum, revogam-se durante o carnaval. “revogam-se, antes de tudo, o sistema hierárquico de todas as formas conexas de medo, reverência, devoção, etiqueta etc”. Então, adianta-se, portanto, que na mídia popular veiculada nas ruas e, principalmente, nos espaços de circulação marginal a teoria bakhtiniana ora apresentada é visivelmente acentuada.



[2] Para evitar mal entendidos grafo termo língua (gem) dessa maneira, utilizando-se da explicação da nota de rodapé do livro: História concisa da lingüística, de Bárbara Weedwood (2002, p. 9), na qual ela explica o motivo de tal uso: “Como o inglês só dispõe da palavra language para se referir tanto à linguagem (capacidade humana de se comunicar por meio da fala e da escrita) quanto à língua (sistema lingüístico particular, idioma), assim sendo, usar-se-á tal expressão quando se estiver referindo tanto à língua quanto à linguagem.

[3] Entenda-se como português aquela língua (gem) produzida pelo homem comum que, infelizmente não teve acesso à aprendizagem formal, contudo, aprendeu à duras penas os fundamentos do idioma para se comunicar e produzir conforme suas limitações sociolingüística.