quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

ENTRE OS MUROS DA ESCOLA”: MUNDO DE IDIOSSINCRASIAS E LINGUAGENS CONFUSAS

ATIVIDADE DE ESCRITA:


O filme Entre os muros da escola, de Cantet (2008) traz como temática central os conflitos entre pensamento de ensinar de um professor, e as expectativas de aprender dos estudantes. Dessa maneira, discorra sobre as idiossincrasias nas formas de dizer e fazer escrita sob a ótica do professor e do aluno. Para isso tome como referência o texto que segue abaixo:

O longa metragem Entre os muros da escola é baseado em livro homônimo de François Bégaudeau (que interpreta a si próprio no longa), o filme relata as experiências de um professor de língua fracesa que usa a literatura como possibilidade para a aquisição da escrita e do bem dizer, em uma escola da periferia de Paris.

O diretor Laurent Cantet aproxima a câmera em constante movimentos da fisionomias dos atores, como que, querendo afirma que as relações entre os indivíduos ali eram marcadas pelo lugar de mistura étnicossocial, um microcosmo da França contemporânea, no qual há minorias estrangeiras, sobretudo, africanos advindos das antigas colônias francesas que, de certa maneira, não se reconhecem dentro de um sistema educacional pautada nas expectativas do mercado profissionalizante dos colonizadores.

Na narrativa, bem se articula o pensamento de que entre o que pensa e faz a escola e o pensam e querem os estudantes com suas ideias, perspectivas e problemas de várias ordens; sejam elas: sociais, econômicas e comportamentais há uma distancia abissal.

Há uma diferença cultural e social que gera incompreensão e atrito entre ambas as partes, retrato do que seria a França contemporânea. Os muros da escola são metonimicamente reveladores de uma divisão e uma impenetrabilidade entre dois lados. Há também outros muros invisíveis que estão sugeridos no filme. Por exemplo, o conflitos ocorridos na periferia de Paris nos últimos anos, em virtude de a polícia ter assassinado um jovem negro. Do lado de dentro do muro está François Marin, um professor de francês. Do outro, está um grupo de alunos entre 13 e 15 anos composto por negros africanos, asiáticos latino-americanos e franceses.

Nesse contexto, François pode ser visto em um primeiro momento, como um educador bem intencionado que, vislumbrando o crescimento intelectual e pessoal dos estudantes, imprimindo o rigor característico de uma escola rígida e disciplinador, mas também como uma espécie de colonizador.

Nessa esteira, se se quer empreender uma compreensão etimológica de seu sobrenome Marin, que pode ser traduzido ao português como marinheiro, este, por sua vez sugere desbravador dos mares e de novas terras. Por isso, sua luta em fazer com que seus alunos incorporem o idioma francês pode ser explicada como uma espécie de "processo civilizatório" imposto a esses alunos de diferentes etnias.

No estrado da sala de aula, lócus de interlocução e entendimento entre professor e estudantes, pode-se afirma que a linguagem é o grande campo de batalha onde é travado esse conflito cultural. O filme se sustenta basicamente apenas com longos diálogos, e muitos deles trazem a dinâmica do que seria de fato uma sala de aula, onde o improviso de ambas as partes predomina.

Conforme é dito pelo próprio diretor que, a inexistência de um roteiro em mãos, os jovens puderam criar seus próprios diálogos, o que dá a sensação de que a realidade daqueles garotos invadia a ficção de "Entre Muros". A invasão da realidade no filme também ocorre por meio dos nomes dos personagens, que é a mesma dos jovens na vida real. Porém, duas exceções merecem menção. Khoumba, vivida por Rachel Régulier, é uma aluna chamada de insolente por se recusar a atender uma ordem do professor. Souleymane, interpretado por Franck Keïta, é o garoto problemático que se indispõe com o professor e seus colegas.

São os dois personagens "rebeldes" e principais questionadores da autoridade de François. Apresentá-los como personagens fictícios parecem querer desvinculá-los do mundo real. Entretanto, eles se apresentam em todas as escolas, inclusive do Brasil.

É como se a visão deste filme francês fosse apenas capaz de ver o "verdadeiro" outro como o "bom selvagem", aquele personagem de outra etnia que se esforça a assimilar a cultura francesa. Talvez por isso, os professores lamentem a possibilidade de deportação do chinês Wei, um aluno dedicado no estudo do francês e bom moço, mas se reúnam para discutir a expulsão de Souleymane, um personagem que vemos falar outro idioma.

O filme reforça uma visão colonizadora a partir do ponto de vista de alguém que se toma, mesmo que inconscientemente, como a "civilização". Assim, o outro se torna o retrato da rebeldia que deve ser conquistado através da assimilação da cultura da "civilização".

Para o público brasileiro, a imagem de alunos que questionam a autoridade do professor e até mesmo são agressivos, possibilita outra discussão. Discussão saudosista de que os estudantes de hoje são menos respeitosos do que os de gerações passadas. “Na minha época o aluno tinha respeito ao professor”.Trata-se de um retrato que talvez não seja diferente do que vemos em escolas brasileiras, em que é comum o relato de desrespeito ao mestre e o inverso também é verdadeiro. Na realidade, infere-se que “entre os muros da escola” exista uma relação de disputa de poder onde os conflitos, as idiossincrasias de cada indivíduo, sejam colocados às claras e, com isso, os mundos se conflitam de maneira a colocar a realidade de relações pessoais bem definidas. “Manda quem pode e obedece quem tem juízo!”.