sábado, 14 de fevereiro de 2009

ENSINO-APRENDIZAGEM SOCIOINTERACIONISTA DE LEITURA

Robério Pereira Barreto*

Resumo: Este artigo visualiza a discussão do ensino de leitura na sala de aula a partir da compreensão de que o ensino-aprendizado de linguagens e leitura é um processo dialógico e, portanto, requer interação entre os sujeitos; seja eles autores de livros, estudantes, professores e comunidade. Por essa ângulo é importante destacar que a metodologia usada nesse processo é significativa e, portanto, cabe ao professor traçar metas que o leve juntamente com os alunos à construção de saber sistemático e crítico a respeito do mundo da leitura e do trabalho, uma vez que, ainda, nossa escola é fundamentada na perspectiva de formar os sujeitos tão somente para o trabalho em detrimento da cidadania e do diálogo entre culturas.

Introdução

Percebe-se que no final do século passado é rompido o monopólio da cultura impressa como único processo de apropriação do conhecimento. A escrita invade e transforma o mundo em uma sala de leitura, rompendo a exclusividade da escola no ensino dessa aprendizagem. A leitura vai perdendo seu caráter público sonoro e se transforma numa forma dinâmica, íntima e silenciosa do leitor se divertir, se informar, se orientar, criar e participar. Aqui a internet que, com uma grande explosão de informações o leitor abandona velhos hábitos remanescentes e desenvolve estratégias diversificadas de leitura; tornando-se múltiplo e seletivo, recorrendo à escrita todas as vezes que busca dar sentido ao mundo ou a si mesmo.
Neste sentido, a cada dia, a sociedade exige dos indivíduos diferenciados tipos de leitura, que visem a uma interpretação crítica da realidade. O leitor antes condicionado a simples processo de decifração de códigos, agora se preocupa com a participação ativa na sociedade.
Como resultado dessas grandes mudanças é imprescindível que o professor redirecione suas metodologias para o ensino da leitura, de maneira a contribuir para a formação de leitores competentes. A afirmativa de que os alunos do ensino fundamental não gostam de ler, deve nos motivar a realizar atividades juntos com outros professores e bibliotecários, para verificação dessa possível realidade e, por conseguinte, contribuir para que se formem novos leitores.
Desse lugar, pode-se iniciar uma pesquisa-ação objetivando, também, a detectar as possíveis causas do desinteresse dos estudantes pela leitura. Com isso procura-se identificar as metodologias utilizadas no que tange ao incentivo e à prática da leitura na unidade escolar. De acordo com o momento histórico atual, sob as influências do neoliberalismo, onde a burguesia elevou a capacidade de exploração e especulação do capital financeiro, gerando mudanças na sociedade e, conseqüentemente, no indivíduo nela inserido é importante que a escola forme cidadãos com consciência necessária para fazer a leitura desse contexto.

Referenciação teórica

Hoje, escola improdutiva que trabalha apenas com ensino fragmentado não interessa. O baixo nível de escolaridade, hoje já não mais contribui para a manutenção da ordem capitalista, afirmam os especialistas em educação e trabalho. Assim, na incorporação do novo padrão tecnológico, no processo de organização da produção e circulação, com novos materiais, processos, nova organização e gestão do trabalho que, segundo Frigotto, dá-se o surgimento dos conceitos; globalização, qualidade total, flexibilidade, integração, trabalho enriquecendo, ciclo de controle de qualidade, a velha escola ficou ultrapassada e a sociedade capitalista se empenhou para influenciar a formação de novos objetivos escolares.
O mundo do trabalho busca uma nova relação entre escola e sociedade, defendendo arduamente uma educação básica que possibilite a formação de um sujeito participativo, flexível e com elevada capacidade de abstração e decisão, a fim de satisfazer as novas exigências do mercado. Dessa maneira, se a escola é local de formação de cidadãos e, além disso, os formar também para o mundo do trabalho é hora de reconhecer que está recebendo um novo emaranhado de objetivos e propostas, as quais já vêm estabelecidas verticalmente. Estas escolas estão até sem entender o porquê das ordens emanadas dos governos dos Estados, desencadeando campanhas que dizem respeito à escola, entende-se que isto seja reflexo da nova ordem econômica que tem se estabelecido no campo empresarial. Diante disso temos a afirmação que diz:

Estamos diante de um dualismo resultante das ações de uma sociedade capitalista e, conseqüentemente, individualista em que a produção vem sendo discutida como algo que deveria ser a salvação da escola e da humanidade, ou seja, a escola precisa produzir leitores e escritores capazes de responder às necessidades do mercado. (BARRETO, 2004, 39).

Faz-se crucial que, aqueles que lutam pela formação do professor e, principalmente, uma formação consciente, busquem este espaço dentro da própria escola, ou seja, a escola é o espaço também dos grupos sociais que formam a classe trabalhadora. Isto é, levando em consideração de que o aluno deve desenvolver em si a capacidade de análise crítica e abstração que são fundamentais para o indivíduo analisar e compreender o momento histórico atual.
A educação enquanto promoção do homem deve estar fundamentada na ação dialética da mesma, reflexão ideológica, a fim de propiciar a uma prática eficaz, pois, o ensino aprendizagem é e deve ser uma prática dialética.
Educar é uma coisa muito ampla, trata de uma formação global e mais completa de um povo, não se restringe ao campo de mera transição de conhecimentos, mas de maneira objetiva, correta e moral dos usos de métodos e meios, ao serviço do bem comum; não é restrita a uma elite, mais distribuída a um grupo, muito mais numeroso, com oportunidades iguais que vão desde condições dignas de sobrevivências até o direito de escolha do tipo de educação e de instrução que pretende ter.
As considerações partem da definição proposta por Saviani que vê a educação como “... mediadora no seio da pratica social global...” (SAVIANI,1989, 17), definição esta retomada por Newton Duarte quando descreve que a prática pedagógica transforma a prática social, não de maneira imediata; essa transformação se dá de maneira indireta, através da ação transformadora de cada indivíduo.
O ensino aprendizagem se torna transformador na medida em que gere nos sujeitos dele participantes transformações que contribuirão para a sua atuação, como sujeitos transformadores da social global.
A pratica social deve orientar os fins da prática educativa, pois do ponto de partida e de chegada podem assumir ou não o mesmo. É o mesmo porque constitui o alvo da ação, o fundamento e a finalidade. Não é o mesmo, se considerar que o modo de se situar como agentes altera-se qualitativamente pela ação pedagógica. Importante lembrar que a alteração da prática se da a partir da nossa condição de agentes sociais ativos, reais, moldados pela ação pedagógica. A educação por tanto, não transforma de modo direto e imediato, e sim, indireto e imediato, agindo sobre os sujeitos da ação.
Nesse contexto social amplo e em constante evolução, a leitura torna-se um mecanismo de interação do homem com a sociedade, possibilitando-lhe uma visão real do mundo. Percebe-se que a leitura aqui mencionada não pode ser considerada com um processo mecânico de decifração, mas uma elaboração ativa do pensamento em busca da compreensão geral.
Se o objetivo de nossas escolas é formar cidadãos capazes de compreender a realidade e superá-la, a leitura como instrumento dessa transformação deve ter por objetivo a formação de leitores competentes.
Através da afirmação de que: “A leitura como prática, é sempre um meio, nunca um fim. Ler é resposta a um objetivo, a uma necessidade pessoal. Fora da escola, não se lê para aprender a ler, não se lê de uma única forma, não decodifica palavra por palavra”. (PCNs, 2001, 57) Uma prática constante de leitura pressupõe o trabalho com a diversidade de objetivos, modalidades e textos que caracterizam as práticas de leitura de fato.
Formar um leitor competente é formar alguém que tenha iniciativa própria, capas de selecionar, que compreenda o que lê, que possa aprender a ler também o que não está escrito, identificando elementos, para que realmente o indivíduo assuma um papel crítico dentro da sociedade. Como afirma Kleiman.

A criança em fase de alfabetização lê vagarosamente, mas o que ela esta fazendo é decodificar, um processo diferente da leitura, embora as habilidades necessárias para a decodificação (conhecimento da correspondência entre sons e letra) sejam necessárias para a leitura. O leitor adulto não decodifica; ele percebe as palavras globalmente e adivinha muitas outras, guiadas pelo seu conhecimento prévio e suas hipóteses de leitura. (KLEIMAN, 2002, p.13).

Através desse processo chegará à construção de uma visão de mundo crítico, embasada, capas de levar o cidadão a agir por si só, sem resquícios de uma sociedade dominadora e castradora de ideais. O indivíduo dito competente, será dito um cidadão segundo o seu sentido denotativo.
Todas as sociedades letradas, os que têm acesso à escrita podem desenvolver quatro habilidades no uso da língua: falar e escrever ouvir e ler. Ao analisar o contexto social brasileiro, vários fatores sociais sócio-econômicos influenciam o desequilíbrio no desenvolvimento dessas habilidades, afetando as condições e chances para o desenvolvimento total do indivíduo. Não se deve deixar de levar em conta também que antes de tudo se encontram aspectos ideológicos, sociais e antropológicos que vão determinar o desenvolvimento das habilidades individuais.
Nos dias atuais, ler e escrever são duas práticas sociais básicas, independentes das importâncias a elas atribuídas. O ensino aprendizagem não é apenas o simples ato de ler e escrever, mas uma habilidade que recebe irrestrita aprovação social institucionalmente incentivada, com status de virtude de caráter normativo e prescritivo.
O educador deve possibilitar o tratamento da leitura como uma atividade de interação através do texto, pois a criança sempre se encontra em situação de aprendizado formal e, na maioria do tempo, está submetida à condição de ouvinte e na medida em que se ignora a leitura dos textos orais, passa por cima de um dos problemas mais elementares da escola. O professor deve trabalhar com textos autênticos pois, o contexto de leitura da criança já está internalizado quando ela vem para a escola e, cabe ao educador aproveitar o conhecimento já adquirido para que a leitura não se restringe as repetições, mas que possibilite uma interação da mesma com a sociedade.
Assim, a escola levando em conta os pressupostos de que o educador já possui algo a ser transformado, deve considerá-lo um ser definido nas ações reflexivas e sistematizada, capaz de articular com os movimentos concretos o processo de transformação em que se encontra e respeitar os valores de cada indivíduo.
Com o intuito de formar cidadãos competentes no desempenho de seus papéis, a leitura é um instrumento que vai possibilitar a interação do indivíduo com o meio, pois a leitura pode ser a interpretação de um fato, de uma situação, de um discurso, etc. O mundo pode ser visto como um grande texto que está pronto para várias leituras. Por base esses preceitos, o professor tem o desafio de trabalhar o ensino da leitura, de tal forma que os educandos possam interagir com a diversidade de texto e estar pronto e admitir as várias leituras possíveis, superando o mito de interpretação única.
Desta forma, o indivíduo que pode diferenciar os vários tipos de texto, que reflete sobre o grau de persuasão do texto apresentado, será um cidadão melhor preparado pára os novos desafios de um mundo em constante evolução, podendo assumir seu verdadeiro papel de transformador da realidade. Para que o professor consiga chegar a esses objetivos é preciso que o mesmo se mostre envolvido com a pratica da leitura. Isto também com base em referência de artigos publicados no PCN que diz:

Para os alunos não acostumados com a participação em atos de leitura, que não conhece o valor que possui, é fundamental ver seu professor envolvido com a leitura e com o que conquista por meio dela. Ver alguém seduzido pelo o que faz pode despertar o desejo de fazer também” (PCNs, 2001, p. 58).

Com isso observa-se que não basta apenas dizer aos alunos faça o que eu mando, mas não faça o que eu faço.
O domínio da língua tem estreita relação com a possibilidade de plena participação social, pois é por meio dela que o homem se comunica, tem acesso à informação, expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz conhecimento. Assim, um projeto educativo comprometido com democratização social e cultural, atribui à escola a função e a responsabilidade de garantir aos seus alunos o acesso aos saberes lingüísticos necessários para o exercício da cidadania, direito inalienável de todos. Essa responsabilidade é tanto menor quanto for o grau de letramento das comunidades em que vivem os alunos. Considerando os diferentes níveis de conhecimento prévio, cabe à escola promover a sua ampliação de forma que, progressivamente, durante o ensino, se forme no aluno a capacidade de interpretação de diferentes textos que circulam socialmente, a habilidade com a palavra e, como cidadão, de produzir textos eficazes nas mais variadas situações.
Tradicionalmente, a leitura tem sido tomada na escola como cumprimento de uma finalidade, priorizando sons e letras, ou o simples processo de decodificação de palavras, como afirma Silva que: “A leitura é sempre colocada como um evento desligado da esfera humana, caracterizada mais como um fenômeno físico que pode ser observado através de lentes de um microscópio.” (SILVA,1991, p. 54).
Visando a formação de cidadãos críticos e participativos, faz-se necessária uma abordagem da leitura numa concepção de linguagem interacionista, que supere a compreensão superficial e se envolva num processo dinâmico entre sujeitos que instituem troca de experiência por meio de textos escritos. É preciso que o aluno leia o material lingüístico más também o implícito, o extralingüístico.
É importante deixar claro ao aluno que, a leitura é um diálogo, “[...] eu vou ao texto carinhosamente, de modo geral, simbolicamente, e ponho uma cadeira e convido o autor, não importando qual, a travar um diálogo comigo” (FREIRE, 1989, p.27). De forma simples constata-se que Paulo Freire sugere o texto uma perspectiva em que não esteja pronto e acabado, mas que seja possível o leitor agir durante o processo de leitura.
Quando tem clareza de que a leitura não é um simples processo de decodificação, e que constitui uma dimensão fundamental do domínio da linguagem, torna-se urgente repensar a prática que a escola vem tradicionalmente fazendo.
O texto não deve ser encarado como simples ato burocrático, onde tem um sentido utilitarista, ou seja, para resolver exercícios gramaticais, servir de modelo para estruturação de frase ou ate mesmo para preencher o tempo. Para reverter essa prática é preciso antes de tudo compreender que o leitor maduro não é um sujeito passivo mas, alguém que constrói, concordando ou discordando do autor do texto, a sua interpretação numa relação de diálogo intimo com aquilo que lê.
Para um progresso significativo e que o leitor e educador chegue a esse nível de autonomia, devemos ser capazes de apresentar o texto escrito não como representação da verdade absoluta, mas que a exposição de todo o tipo de texto ao aluno, (narrativo, informativo, dissertativo, poético etc.) possibilite a compreensão de cada um de sua especialidade e revele uma determinada interpretação sobre o real.
O gosto pela leitura e o despertar pelo prazer de ler podem nascer através de momentos de interação entre professor e alunos entre alunos, através de diálogo entre textos lidos e da valorização à leitura do outro. Para que ocorra essa evolução no processo de formação de leitores, é importante procurar condições, algumas sugeridas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais:
*organizar momentos de leitura;
*planejar as atividades diárias garantindo que as de leitura tenham a mesma importância que as demais;
*possibilitar aos alunos a escolha de suas leituras.
Assim a leitura deve ser um instrumento de construção e reconstrução do saber, pois se o educando estiver em contato com todo tipo de texto, sendo incentivado de forma correta a praticar a leitura, conseqüentemente, ele estará sistematizando o seu conhecimento, torna-se competente não só na leitura, mas em todo o seu desenvolvimento.
No modelo tradicional de educação, verificamos que o conhecimento é tratado como se fosse um conteúdo. Dizemos que temos que aprender o que esta nos livros. Essa noção do conhecimento não corresponde aos fatos demonstrados por pesquisas da psicologia cognitiva. Sempre participamos ativamente da construção de nossas idéias na vida cotidiana. Quando assistimos a um filme, tiramos nossas próprias conclusões sobre o significado. Assim, nossas interpretações podem ser totalmente diversas. Há um filme só. Mas nossa maneira de representar o filme mentalmente varia, dependendo de nossos interesses, experiências anteriores e capacidade. Por isso, dizemos que o conhecimento que temos sobre o filme não é o filme, é nossa maneira de representá-lo e interpretá-lo.
A aprendizagem é ato cognitivo que depende de fatores externos e dos sentidos para sua realização. É uma dimensão de ação, só posso aprender realmente o que faço, e só posso estar verdadeiramente seguro do que sei no momento em que me torno capaz de fazer. Toda aprendizagem começa pela ação e termina por ela.
Outra dimensão é a do conhecimento, só posso aprender o que compreendo, no momento em que o faço; é por isso que a análise do que se passa quando se aprende é uma passagem obrigatória de toda a aprendizagem, qualquer que seja a idade daquele que aprende. Esta dimensão do conhecimento se opõe ao condicionamento. Sem a consciência e sem a compreensão daquilo que se aprende, é impossível aperfeiçoar e adaptar esse conhecimento as novas situações. O condicionamento fecha o caminho para a aprendizagem verdadeira. A análise, o estabelecimento de relações é fator de desbloqueamento das dificuldades é fator de aprendizagem.
A cada conceito novo, se produz uma reorganização do saber anterior, a partir de uma seleção inconsciente do que foi dito ou lido. O saber se constrói e reconstrói por aquele que aprende, através do relacionamento de dois tipos de dados: o encontro de obstáculo que provocam a tomada de consciência de necessidades novas é desestruturação mental daquele que aprende, daquilo que sabe, frente ao que lhe é apresentado, acontece um julgamento interior colocando o que recebeu em confronto com que já tinha de experiência, formulando assim os seus conceitos, um saber novo.
Podemos afirmar que a aprendizagem acontece a partir da teorização, mas é determinada pelas experiências anteriores, a maneira cognoscitiva de organização do pensamento e do contexto sócio-cultural do aluno.
O estudo é a atividade cognoscitiva do aluno por meio de tarefas concretas e práticas, cuja finalidade é a assimilação consciente de conhecimentos, habilidades e hábitos sob direção do professor. A atividade cognoscitiva não pode ser considerada simplesmente como a manipulação de objetos, vivências de situações concretas, memorização de regras e fórmulas ou resolução de problemas e tarefas. Essas atividades externas só têm relevância se, gradativamente, forem transformando em atividades internas, como instrumentos do pensamento.
O professor precisa embarcar no nível de conhecimento e no ritmo e maneira de compreender de seus alunos; de como seus alunos estão formulando suas hipóteses; sugestionar a criar, a desenvolver a capacidade e habilidades pessoais.

Professor e cidadania
O professor perdeu através dos tempos, o direito, ou seja, a propriedade da sala de aula; raros são os professores que tem um projeto próprio para seu trabalho. O que tem passado aos alunos é apenas cópia ou parte de proposta de autores, fora do contexto de trabalho. Dessa forma o professor não é dono mais do que pratica. Nem ele próprio é capaz de fazer uma interpretação da realidade circundante sendo ele um peso morto.
A técnica utilizada para o ensino da leitura é aquela que visa a capacidade inata do aluno; isso prova porque a maioria do alunado que egressa não tem se apresentado capaz de se colocar de maneira firme, fazer o uso da norma culta e viver segundo os padrões de reflexão crítica do sistema. “... a opção por uma proposta é definida por uma concepção de objetivo de estudo e do que é ensinar e aprender” (MATENCIO, 1994,p.97). Sendo o objetivo estudo o aluno real, sua cotidianidade, uma proposta para essa realidade, gera uma ação pedagógica que desencadeará em ações cocientes na sua prática. Uma proposta nestes termos, aquela que o fio condutor é o aluno e o ensino aprendizagem, é constituída pelo professor em interação com seus alunos. Ao elaborar sua proposta, o professor se torna sujeito de sua prática; assim, o livro didático será apenas um meio, estará a serviço da ação do professor.
O professor sujeito é aquele que desenvolve uma ação pedagógica que colabora na formação do cidadão; é um professor consciente e criativo que sabe problematizar, sabe lidar com a individualidade e também com a coletividade da vida social, ou seja, que trabalha em prol da aquisição de conhecimentos por parte de cada aluno e que se preocupa na formação de uma proposta social enquanto coletividade, levantando e inserindo no seu trabalho questões relevantes do momento; assim, a aula é entendida como espaço privilegiado de formação de atitudes.
Um professor nestes moldes precisa receber uma qualificada formação. Para o professor Antonio Severino, a formação do profissional que trabalhe pela conscientização, deve acontecer em três dimensões:

A formação de professores é uma tarefa que pressupõe o desenvolvimento harmonioso de três grandes perspectivas ·que se impõe com a mesma relevância, que se distinguem, mas ao mesmo tempo, se implicam mutuamente, que só produzem seus resultados se atuando convergente e complementarmente. Essas três dimensões são as dos conteúdos, e das habilidades didáticas e das relações situacionais. (MATENCIO, 1994: 97).

A dimensão dos conteúdos é aquela relacionada com o domínio de conhecimentos. Tem a ver com a cultura científica em geral, com o saber. A outra face da pirâmide está no domínio de habilidades didáticas, que constituem a esfera dos instrumentos técnicos e metodológicos de sua profissão.
A exigência de domínio dos recursos técnico-científico de sua habilitação profissional de educador, além da apropriação do acervo de conhecimentos científicos que os fundamentam, resgata a essencial significação do trabalho enquanto atividade fundamental do modo de ser do homem.
A terceira dimensão é chamada de dimensão das relações situacionais. Isso porque o trabalho do professor pressupõe como uma necessidade, uma percepção muito clara e explícita das condições de existência de todos os sujeitos que estão envolvidos no processo educacional. Estas referências dizem respeito, para os sujeitos, à compreensão de si mesmos, dos outros, de suas relações recíprocas, a compreensão do grupo social ao qual pertence e da humanidade como um todo. As relações situacionais permitem ao professor uma auto-compreensão de si mesmo e de seus alunos.
Retomando a questão da dimensão dos conteúdos, domínio das habilidades técnicas e das relações situacionais, estas três dimensões devem ter desenvolvimento igualmente aprofundado, uma vez que cada uma delas, como cada um dos lados da pirâmide, pressupõe a outra, num processo de mútua implicação. A formação do profissional, que não tenha as relações situacionais presente e como ensinar estando implícitas as relações situacionais é uma formação incompleta. Dessas três, uma não pode ser diminuída em prol da outra. Ao contrário, se completam.
O currículo para a formação do profissional da educação, implica uma organização multidisciplinar, a educação vai buscar o conhecimento dos diversos campos, para organizar as bases da formação do profissional; assim, a educação recebe a contribuição dos diversos campos do conhecimento. “O professor é o principal livro a ser lido e estudado pelos alunos”. (SILVA, 1991, p. 21) Esse livro que é o professor, não só informa, mas também forma aqueles com quem convive. Dessa forma, a formação do professor além de ser multidisciplinar, deve ser interdisciplinar, as diversas disciplinas no curso de formação do professor se completam entre si. Assim, toda conclusão obtida numa área fica como que incompleta, aberta, como “encaixe” preparado para receber complementação de outra área
Somente com uma formação nestes moldes, o professor estará preparado com a devida competência para desenvolver uma revisão crítica dos vários discursos ideológicos, até mesmo dos discursos da ciência e da tecnologia, que envolvem essas práticas. É desta maneira que poderá estar continuamente reavaliando o seu projeto pessoal de profissional da educação e sua inserção no projeto político mais amplo de sua comunidade à luz de uma avaliação crítica dos processos históricos de construção do conhecimento e da revisão dos valores que são apresentados com critérios de sua ação concreta.
O professor cidadão é consciente de suas ações, que trabalha com vistas a dar respostas à sociedade, que desencadeia uma prática buscando valores e atitudes.

A vivência na escola
Para a formação do leitor ativo e consciente, quem ensina tem que se preocupar com a adequação dos textos, ao nível de escolaridade, ao nível do contexto social e do processo de organização cognitiva, do pensamento.
O empenho do educador está em estimular o raciocínio dos alunos, instigá-los a emitir opiniões próprias sobre o assunto, fazê-los ligar os temas a coisas e eventos do cotidiano. A percepção sensível de objetos, fenômenos e processos da natureza e da sociedade é o tipo de conhecimento pelo qual se inicia o tratamento científico da realidade.
Ao se observar à ligação entre os objetos e fenômenos, sua propriedade essencial, também se analisa a intervenção da prática social, a história da ligação da atividade humana com o objeto de estudo para satisfazer necessidades humanas. Na medida em que o processo educativo é indissociável da vida prática, a percepção é condicionada a essa atividade prática, que evidentemente tem a ver com a vida material e social dos alunos. Assim, as tarefas docentes devem convergir para incrementar capacidades cognoscitivas, operativas e a capacidade crítica, simultaneamente.
No estudo de um tema, é fundamental o encaminhamento dos alunos no confronto entre as noções sobre os fatos e os fatos mesmos. É necessário descobrir os nexos sociais implicados nessas noções, pois o conhecimento tem sua origem e sua destinação na prática social, porquanto o aluno se reconhece nos conceitos que lhe são significativos.
Os processos de apreensão das qualidades e características de objetivos e fenômenos e a formação dos correspondentes conceitos científicos estão vinculados à direção da atividade humana, seus objetivos e motivos, à experiência social e cultural do aluno, aos seus valores, conhecimentos e atitudes frente ao mundo.
A leitura na escola tem sido, fundamentalmente, um objeto de ensino. Para que se constitua também em objeto de aprendizagem, é necessário que faça sentido para o aluno, isto é, a atividade de leitura deve responder a objetivos de realização imediata. Como se trata de uma prática social complexa, para a escola converter a leitura em objeto de aprendizagem, deve preservar sua natureza e sua complexidade, sem descaracterizá-la. Isso significa trabalhar com a diversidade de textos e de combinações entre eles. Significa trabalhar com a diversidade de objetivos e modalidades que caracterizam a leitura, ou seja, os diferentes “pra quês” – resolver um problema prático, informar-se, divertir-se, estudar, escrever ou revisar o próprio texto – e com as diferentes formas de leitura em função de diferentes objetivos e gêneros, como diz Abramovich:...ler para mim sempre significou abrir todas as comportas para entender o mundo através dos olhos dos autores e da vivencia dos personagens (ABRAMOVICH,1991,P.14) ler, buscando as informações relevantes, ou o significado implícito nas entrelinhas, ou dados, para a solução de um problema.
Sendo o objetivo formar cidadãos capazes de compreender os diferentes textos com os quais se defrontam, é preciso organizar o trabalho educativo para que experimentem e aprendam isso na escola. Principalmente, quando os alunos não têm conhecimento sistemático com bons materiais de leitura e com adultos leitores, quando não participam de práticas onde ler é indispensável; a escola deve oferecer materiais de qualidade, propiciando a formação de leitores proficientes e práticas de leituras eficazes. É preciso, portanto, praticar a leitura buscando sempre um horizonte maior; é ler para ler o mundo...ser leitor é ter um caminho absolutamente infinito de descoberta e de compreensão do mundo... (ABRAMOVICH, 1991, P.14).
Em uma época, a Folha de São Paulo publicou um dado impressionante: menos de 1% (um por cento) da população brasileira detém 34%(trinta e quatro por cento) das terras do Brasil. O professor deve ter essa capacidade de visão mais ampla, não pode saber apenas o seu conteúdo, precisa ter a capacidade de juntar os fatos, de fazer uma análise bem fundamentada. Deve também, receber o que o aluno tem, a cotidianidade.
À escola não basta preparar para a vida, ela tem que ser vida. A aula tem que falar da vida, o que se fala dentro da escola deve ser o mesmo que se está falando lá fora. A questão é o ensino e a aprendizagem, é o ato pedagógico, através do que o professor vai questionar, ajudar o aluno aprender a aprender. O professor constrói e o aluno também constrói. É o que ele vai levar para a vida; não os nomes dos clássicos da literatura, mas o questionamento, o relacionamento, o pensamento, a reflexão filosófica.
O professor é a peça fundamental, é uma questão de postura metodológica, de encaminhamento. Para entender o que acontece no Brasil hoje e projetar no futuro, é preciso uma série de informações do passado. O trabalho do professor é ajudar o aluno a interpretar o mundo, a ler o que está acontecendo. Se vivemos em um país capitalista, onde melhorar as condições de vida é alvo da maioria excluída, o estudo é fundamental para descobrir que este sistema foi pensado por alguns e se alguns formaram o mundo desta maneira, temos que trabalhar para modificá-lo. Este é o trabalho da educação.
Os descaminhos têm se apresentado na escola na questão metodológica. O professor tem tido dificuldade em fazer uma prática a partir do embasamento filosófico-teórico, falta de coerência entre opção política e prática pedagógica,

[...]muitas vezes, o discurso sobre a mudança e inovação não passa de mero discurso, ou seja, o educador diz que está trabalhando em prol da transformação da sociedade e da libertação do povo, porém, em termos de encaminhamento do ensino junto a seus alunos, ele se trai completamente acionado conteúdos estéreis, procedimentos retrógrados e avaliações autoritárias. Enfim, esse educador é democrático no dizer, mas autoritário no fazer, demonstrando incompetência para vincular o seu pensamento e os seu discurso à ação, à prática concreta. (SILVA, 1991, p. 78)


Metodologicamente falando, somente a opção política não basta, ou o professor tem um encaminhamento claro para suas ações de acordo com sua opção política, ou se perde os objetivos. Por este encaminhamento, subentende-se conhecimento prévio da matéria, que dará autoridade ao professor, habilidade com as técnicas e procedimentos de ensino, e colocar-se profissionalmente como alguém que induza o questionamento, que venha buscar um novo conceito de ensino e leitura a partir das contribuições das relações situacionais.
Newton Duarte, citando Oliveira, coloca esta questão como a necessidade de colocarem objetivos “em si” ao nível de prática educativa “para si”.

É preciso tornar a prática educativa ‘em si’ em prática educativa ‘para si’. Isto é: é preciso questionar profundamente a ação especificamente pedagógica que pretende socializar o saber, intencionalizando o conteúdo a ser transmitido em relação orgânica com uma forma adequada, de maneira a tornar concretos os objetivos (os específicos e também os sociais) anteriormente previstos (...) O objetivo último de contribuir para a transformação das estruturas teria, portanto que ser assumido intencionalmente como fio condutor de toda a elaboração e realização dessa prática educativa. Não prever antecipadamente as condições básicas para a função daquele objetivo último, inviabiliza muito o trabalho pedagógico que pretende ser uma atividade mediadora intencional no seio da prática social global. (DUARTE, 1996, p.04)

O trabalho do educador é ajudar o aluno a interpretar o mundo; as aulas de leitura têm muito a colaborar com esse objetivo. A contribuição de cada professor será tanto mais eficaz quanto mais o professor seja capaz de compreender os vínculos de sua prática com a prática social global.
Uma maneira para se trabalhar o ensino da leitura, é a problematização. A educação problematizadora parte do pressuposto de que uma pessoa só conhece bem algo quando o transforma, transformando-se a si mesmo no processo; a solução dos problemas é uma forma de participação ativa e de diálogo constante entre alunos e professores para se atingir o conhecimento.
Tecnicamente falando, o processo de leitura deve ser organizado a partir da convivência com o meio social e cultural, a escola não pode perder esse fio condutor. Os temas abordados devem encaminhar-se para uma práxis. O contexto deve vir para a escola, ser debatido, questionado, problematizado, propostas de alternativas precisam fluir; o processo de leitura é a porta para essa problematização e as chaves estão nas mãos do professor.
Não se trata de ensinar a leitura com “temas geradores”, não importa como o professor começa a sua aula; o que importa é o que vai encaminhar com sua sala, é a capacidade que vai desenvolver em seu aluno. Havia três cegos e um elefante. O primeiro cego passou a mão na cauda e disse: é uma corda; o segundo tomou uma das patas e disse que era uma coluna; o terceiro passou a mão no corpo do elefante e afirmou que era uma parede.(JORNAL DO ALFABETIZADOR) Isso é o que acontece, somos treinados para ver não mais que pedacinhos, é a cultura do desvinculo. Esta tem atacado professores e chega aos alunos. Para isso, é fundamental a competência do profissional.
A função da leitura é desenvolver habilidades de análise, crítica, reflexão, perceber ideologias, enfim, colaborar na formação do cidadão consciente em suas ações.
Em um artigo publicado por BARRETO deixa claro que a escola deve desenvolver “o espírito crítico diante da mídia”. A leitura se faz presente ao cumprimento desse objetivo, pela sua importância na capacidade que apresenta na formação de atitudes e da reflexão crítica. A leitura não perde sua especificidade e sua importância, “a cada dia os meios eletrônicos nos apresenta uma quantidade considerável de informação, porém não são bem estruturadas, visto que as funções da linguagem usadas nesse tipo de textos são altamente direcionadas, levando o leitor a uma leitura tendenciosa” (BARRETO, 2004: 33,34). Dessa forma, por mais que o grau de desenvolvimento da tecnologia facilite a vida do homem, o processo de leitura o acompanha, a capacidade de compreensão, interpretação e comunicação são requisitos básicos em qualquer sociedade moderna.
As crianças e adolescentes de meios ditos iletrados, geralmente de classes economicamente desfavorecidas, ao entrarem na escola encontram discursos e modelos de socialização bastante distintos daqueles praticados no seu meio, precisando de um tempo maior de adaptação e aprendizagem. Esta descontinuidade, que já é lugar comum na nossa literatura especializada, se apresenta como uma das maiores dificuldades da escola, que ainda transforma dificuldade cultural em deficiência, reforçando e reproduzindo as discriminações. Como fazer com que estas crianças possam penetrar na corrente? Não basta ter o texto escrito exibido. Para ela, a escola é o agente de alfabetismo por excelência.
O texto escrito, escolhido pelo professor para leitura, tem que, necessariamente, conduzir à reflexão filosófica, a análise dos problemas reais da vida; devemos nos preocupar com uma intelectualidade, mas também com o retorno para a vida prática, devemos educar sobre valores reais sem perder de vista a cotidianidade do saber sistematicamente elaborado.
Para encaminhamento do processo de prática de leitura, estávamos falando da problematização. Com este trabalho é notável o aumento da capacidade do aluno para detectar os problemas reais e buscar para eles soluções criativas. O papel do professor nesse sentido é o de criar condições favoráveis de desenvolvimento das formas de pensar reflexivamente, de modo a atingir uma lógica no ato de pensar.
A problematização parte da realidade e volta para ela, passando pelo processo de síncrese, análise e síntese do conhecimento. O confronto entre as percepções primeiras dos alunos com o conhecimento já elaborado permite uma análise e compreensão mais profunda, lógica e até científica do que acontece na realidade, para se chegar a um conhecimento reelaborado por parte do aluno, um saber mais sistematizado.
Esta não é uma proposta nova para o trabalho com a leitura, sabemos que muitos educadores já traçam seu trabalho neste moldes; o que pretendemos foi apenas registrar algumas considerações pessoais que estão servindo como base para o nosso trabalho neste momento.
Sócrates, em sua dialética, já se preocupava em perguntar sobre os detalhes da vida cotidiana, buscando as evidências empíricas e racionais. Na problematização o questionamento é posto como um desafio a uma investigação eventual, ela instaura a dúvida nos alunos atitudes críticas e criativas em relação ao meio em que vivem. Desse modo, seu potencial de cidadão é mobilizado de forma intencional e sistematizado, como compete à Instituição Escolar proceder.
As reflexões aqui apresentadas sobre o processo pedagógico quanto ao ensino da leitura, procuram despertar para um novo processo referente à formação de leitores com competentes que estejam aptos a interpretar com criticidade a realidade.
Para tanto se torna crucial que o profissional envolvido com o processo de ensino aprendizagem e que pretende colaborar para o desenvolvimento desse processo se situe numa postura metodológica embasada teoricamente, que possa suprir as necessidades dos indivíduos.
O professor precisa se situar no meio histórico-social contemporâneo para não educar para o passado; o educando é um sujeito que vive o hoje, cheio de experiências, e pelas ações, parece que o professor ainda acha que o educando é uma folha em branco.
A leitura deve ser vista como instrumento de interação do homem com a realidade e, para tanto, é necessário o desenvolvimento de um leitor criativo, competente e dinâmico, fugindo do pragmatismo que vê a leitura como um simples ato mecânico.
Na tentativa de apresentar algo concreto, que vislumbre a formação desse leitor, é que foi elaborado esse trabalho, que através da análise dos referenciais bibliográficos constata-se a comprovação de que a metodologia utilizada pelos professores conota uma linha tradicional de ensino de leitura, voltada para a repetição e mecanicidade; daí a necessidade de uma reformulação da proposta metodológica para o ensino de leitura, para que atenda aos objetivos do processo de formação de leitores críticos e competentes, que estejam aptos a integrar-se com o meio que estão inseridos.
A falta de uma proposta metodológica para o ensino de leitura por parte dos professores, exclui a possibilidade de uma avaliação e reelaboração das idéias por parte dos alunos; pelo contrário, vai contribuir para uma leitura técnica ou sem objetivos, desvinculando-se do seu papel principal que é o desenvolvimento de um leitor apto a diferenciar as diversas conotações e persuasões contidas nos textos e situações que envolvem a leitura.

Referências
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* Professor de Linguagens e Educação da UNEB – Campus – XVI.