domingo, 6 de julho de 2008

RISCO DE PÓS-MODERNIDADE NA LITERATURA DE MATO GROSSO: GEREÇÃO DE 90

RISCO DE PÓS-MODERNIDADE NA LITERATURA DE MATO GROSSO: GEREÇÃO DE 90
Robério Pereira Barreto

O homem nasce bárbaro. Redime-se da condição de besta cultivando-se. A cultura nos transforma em pessoas; e tanto mais, quanto maior for a cultura. [...] Não é apenas a inteligência que devemos apurar, mas também nossos desejos e principalmente nossa conversa.
GRACIÁN, Baltasar. Cultura e esmero in: Arte da Prudência, 2001. 57)

Introdução

Oscilar entre o regional e o universal; esse é o caminho daquele que se interessa pelo estudo da literatura e cultura de modo sistemático, pois o imagético, lingüístico e, até mesmo o social, chega, às vezes, a ser enigmático. Portanto, os conceitos de arte e cultura a partir das teorias da pós-modernidade ganham campo e passam a abordar vários temas, observando é claro, as particularidades e as identidades de cada segmento.
Assim sendo, trata-se de buscar junto à produção literária de Mato Grosso na década de noventa, traços que apontem para o entendimento das teorias da pós-modernidade por parte dos autores – poetas e artistas – regionais, buscando assim, discutir as filiações, influências e tendências. Para tanto, elegrmod, a priori, como base de argumentação os pensamentos de Terry Eagleton, Antônio Candido e Afredo Bosi.
O pós-modernismo na visada de Terry Eagleton
Hoje, o conceito de pós-modernismo praticamente dilui-se em meio à diversidade das discussões acerca de sua aplicabilidade. Mas para fins didáticos, emprestamos aquele apresentado por Eagleton em As ilusões do pós-modernismo, 1998. “A palavra pós-modernismo refere-se em geral a uma forma de cultura contemporânea, enquanto o termo pós-modernidade alude a um período histórico específico.”
A definição do crítico nos remete à produção artística na década de 90, visto que a cultura no último decênio do século passado viveu várias vicissitudes. Nessa perspectiva convém apresentar o que Eagleton conceitua como pós-modernismo e pós-modernidade.

Pós-modernidade é uma linha de pensamento que questiona as nações clássicas de verdade, razão, identidade e objetividade, a idéia de progresso ou emancipação universal, os sistemas únicos, as grandes narrativas ou os fundamentos definitivos de explicação. [...] um conjunto de culturas ou interpretações desunificadas gerando um certo grau de ceticismo em relação à objetividade da verdade, da história e das normas, em relação às idiossincrasias e a coerência de identidades, (EAGLETON, 2001, p. 7).

Dessa forma, Eagleton leva à visualização de que o mundo da pós-modernidade pode ser visto com algo ainda discutível, ou seja, as sociedades ainda estão construindo seus paradigmas tanto sociais quanto culturais. Na verdade, a pós-modernidade caracteriza as culturas em virtude da efemeridade do mundo e da razão – sistemas sólidos.
Eagleton conceitua e discuti o pós-modernismo que, segundo ele pode ser entendido como uma questão híbrida, conforme segue:

um estilo de cultura que reflete um pouco essa mudança memorável por meio de uma arte superficial, descentrada, infundada, auto-reflexiva, divertida, caudatária, eclética e pluralista, que obscurece as fronteiras entre cultura elitista e a cultura popular, bem como entre a arte e a experiência cotidiana. O quão dominante ou disseminada se mostra essa cultura – se tem acolhimento geral ou constitui apenas um campo restrito da vida contemporânea – é objeto de controvérsia. (EAGLETON, 2001, p. 7).

Pode-se chamar dialético a este processo porque ele tem realmente se constituído numa integração progressiva da atividade teórica e filosófica da vida nas sociedades modernas, por meio da tensão entre a questão clássica e o estilo empreendido pela cultura de dada época e região.

Os primórdios da cultura e da literatura em Mato-Grosso
Imagine a força que pode ter um movimento que nasça a partir de uma radical segregação interna. Em uma palavra, pense o que pode se tornar para a cultura literária nacional no momento em que a arte a cultura mato-grossense virem à tona.
Não obstante isso, Antônio Cândido pondera sobre a literatura brasileira e afirma:

A nossa literatura, tomando o termo tanto sentido estrito quanto amplo, tem, sob este aspecto, consistido numa superação constante de obstáculos, entre os quais o sentimento de inferioridade que um país novo, tropical e largamente mestiçado, desenvolve em face de velhos países de composição étnica estabilizada, com uma civilização elaborada em condições geográficas bastante diferentes. (CÂNDIDO, 2000, p. 110)

Se se aplicar o discurso de Cândido à atividade cultura desse estado [Mato Grosso] certamente, encontraremos ressonância na formação da literatura no período pós-democratização, ou seja, atualmente, o estado abraça uma série de identidades, visto que o processo de colonização se deu com a abertura das fronteiras agrícolas.
No que diz respeito à posição geográfica, o Mato Grosso tem se mostrado importante para a economia nacional. Contudo, os investimentos em arte e cultura, ou melhor, na valorização dos aspectos culturais tem sido de maneira fragmentada, até porque, não tem sobrado tempo para se investir em cultura. “A cultura dominada perde os meios materiais de expressar sua originalidade” afirma Ecléa Bosi.
Essas palavras são de profunda reflexão, pois nos remete a uma discussão sobre o conceito de desenraizamento[1] cultural e econômico vivido nos dias atuais pela sociedade mato-grossense.
“[..] Se hoje se luta pela demarcação de territórios, pela autonomia cultural do indígena, é porque não existe um todo social de que ele participaria, mas uma sociedade dividida em antagonismos onde ele entraria fatalmente como presa. Isola-lo do predador é defesa de sua cultura e de sobrevida.” (Bosi, 2002, pp 16-7).

Os aspectos e conseqüências da colonização moderna de Mato-Grosso.

Estamos no início do século e no Mato Grosso e os flashes da imprensa nacional se voltam para divulgar os avanços da questão agrícola, que define paisagem econômica propícia para novos investimentos. Contudo, estes mesmos atos, diretos ou indiretamente relegam os aspectos da cultura do estado ao segundo plano.
Dessa forma, se ganha de brinde a reificação da marginalidade quanto à cultura nacional. Para Beatriz Sarlo (2002:7), este esquema é uma característica das sociedades contemporâneas, nas quais o aspecto econômico torna-se elemento de primeira linha. “(daí o caráter tributário de muitos processos cujos centros de iniciativa se encontram em outro lugar); e a solene indiferença com que o Estado entrega ao mercado a gestão cultural, sem estabelecer para si uma política de contrapeso.”
Como outros estados brasileiros, o Mato Grosso vive um clima do que se chama conseqüência da pós-modernidade, pois há uma fragmentação e certos elementos paradoxais em suas atividades sócio-culturais. Então vejamos: São várias chamadas reificando as ações do estado voltadas para o desenvolvimento econômico. Contudo, não se tem mostrado nenhum projeto nem para o resgate nem para a valorização das artes.
Então, como pensar em identidade cultural em sociedade plural, cujas ações estão voltadas para a exploração e acumulação? Para responder esta questão tomo de empréstimo o discurso de Ecléa Bosi, o qual oferece um entendimento do processo de colonização sofrido pelos Estados de fronteira agrícola, por exemplo; Mato Grosso, Goiás e Rondônia.

A conquista colonial causa desenraizamento e morte com supressão brutal das tradições. A conquista militar, também. Mas a dominação econômica de uma região sobre outra no interior de um país causa a mesma doença. Age como conquista colonial e militar ao mesmo tempo, destruindo raízes, tornando os nativos estrangeiros em sua própria terra. (BOSI, 2002, p 17).

Ela ainda corrobora dizendo: “No campo brasileiro a conquista acontece sob as forma de monocultura e pastagens. O arroz, a soja, a cana provocam tão forte migração de lavradores que constituem genocídio pelo número dos que vêm morrendo no caminho para o Sul.” (BOSI, 2002, p 17).
Sintomaticamente, a escola não tem penetrado nem aos valores culturais populares nem burgueses, visto que usa de paradigmas que não se aplica mais à sociedade pós-moderna, na qual o processo de hibridização tornou-se uma constante e tem conseguido transforma as identidades ao sabor das ideologias do sistema.
A exemplo disso, é o sentimento de culpa quando se discuti a identidade dos sujeitos e suas classes. Para Bosi (2002:21), a escola apela para sentimento de identidade pessoal e, automaticamente, exalta a força individual como sendo a melhor maneira de manter os créditos pelo sucesso – self your self ­-.
Assim sendo, procura despertar no sujeito o convívio com a cultura. Contudo, esta não é a local, mas sim, culturas distantes – outras regiões e até outros paises.
Bibliografias
BOSI, Alfredo. Cultura brasileira: temas e situações. 4. ed. São Paulo: Ática, 2002.
CÂNDIDO, Antônio. Literatura e sociedade. 8. ed. São Paulo: T. A. Quiroz, 2000.
EAGLETON, Terry. As ilusões do pós-modernismo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
SARLO, Beatriz. Cenas da vida pós-moderna:intelectuais, arte e videocultura na Argentina (trad.) Sérgio Alcides. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 2000.
[1] Conceito usado por Ecléa Bosi no ensaio intitulado: Cultura e desenraizamento.

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