CIBERCULTURA E A PUBLICIDADE
Jornal da Unicamp 178 - Páginas 12, 24 a 30 de junho de 2002
A arte que sai da tela: Publicitária mergulha nos espaços de criação da Internet
Roberto Costa
A seqüência de um mesmo rosto feminino, com a boca pressionada por uma mão (http://www.totalmuseum.org/webproject8/muzzle/); pictogramas de obras de arte famosas (http://www.ljudmila.org/~vuk/ascii/blind/); relógios exóticos e não-convencionais (http://massaclocks.com); sexo a distância (http://www.fu-fme.com/). A diversidade demonstra como artistas desenvolvem, na Internet, a chamada Net-Arte e a forma como designers se utilizam diferentemente da web como espaço de criação. O resultado dessas observações resultou na dissertação de mestrado da publicitária Hélia Vannucchi junto ao Departamento de Multimeios do Instituto de Artes (IA). “Os artistas trabalham com ‘maior liberdade’, enquanto os designers têm um problema a resolver, uma mensagem a comunicar”, resume Hélia.
Para chegar à conclusão, a pesquisadora “navegou” meses por sites de artistas e de designers (veja abaixo) escolhidos na web. Alguns deles foram indicados pelo professor Gilberto Prado, do IA, orientador da dissertação. Hélia queria conhecer a web como espaço de criação e fazer um contraponto entre sites de artistas e designers. Para isso trocou e-mails com suas fontes e permaneceu horas à frente de páginas que aparentemente não queriam dizer nada. Num destes enigmas aparecia a seguinte frase: “Seu número é 79. Por favor, espere”. Logo a seguir estava em destaque o número 77 (os números são aleatórios e mudam conforme a hora de acesso). Hélia conta que o site sempre larga o usuário esperando, até que vem a mensagem: “Perdeu a sua vez” e a proposta de um novo número para espera. A publicitária passou uma tarde à frente do computador. “Eu abri html, cgi, tentando descobrir se havia alguma coisa por trás”, explica Vannucchi. Isso porque em um outro trabalho, apenas citado na dissertação, da dupla Jodi – Joan Heemskerk e Dick Paesmanns (http://www.jodi.org)-, existiam elementos escondidos no código fonte, no html do site, só visível para aqueles que realmente exploravam o trabalho.
O gesto da mão na boca representa para o artista russo Alexei Shulgin uma crítica à censura que oprime homens e mulheres em diversos países. Os pictogramas de Vuk Cosic, artista esloveno, fazem uma crítica à forma como a história da arte, da net-arte, assim como a história de modo geral é contada de acordo com os interesses da classe dominante. Cosic é arqueólogo por formação e diz que existe uma semelhança entre o que ele faz agora, com a arte, e o que fazia como arqueólogo, já que ele continua construindo narrativas. O designer Roger Los fez o site para a Massa Clocks, que fabrica os relógios. Hélia analisou a construção visual e a navegação do site.
Sexo a distância? Para Alexei, o autor do trabalho, trata-se de uma crítica às pessoas que trocam as relações pessoais por relações mediadas pela máquina, fazendo uma alusão ao programa de videoconferência CU-SeeMe. A publicitária Hélia Vannucchi incluiu entre suas fontes uma brasileira, a designer Verônica D’Orey, de São Paulo, autora do site da cantora Marisa Monte. Conforme Hélia, seus trabalhos em geral têm um design limpo, com áreas de descanso para os olhos.
Das conclusões do trabalho de Hélia há informações de que Alexei Shulgin imprime críticas sociais em seus trabalhos, que Vulk Cosic atualiza a linguagem ASCII, enquanto Holger Friese trabalha a negação de elementos habituais de navegação em suas obras. A dissertação defendida no Instituto de Artes está disponível em http://www.actualis.com.br/mestrado.
Galeria on-line
Alexei Shulgin é russo, mora e trabalha em Moscou. É artista e curador de diversos projetos na Internet e já participou de mais de 60 mostras e inúmeros simpósios sobre fotografia, arte contemporânea, novas mídias e comunicação.
Vuk Cosic nasceu em Belgrado, Iugoslávia. Vive em Ljubljana, Eslovênia. Formado em arqueologia, é, também, um dos pioneiros da arte on-line.
Verônica D’Orey é designer e tem seu próprio escritório em São Paulo. Na exposição Design Ritmo, apresentou o trabalho daquipralá delápracá, realizado com a colaboração de Carolina Jabor e com música de Naná Vasconcelos.
Roger Los é autodidata. Em 1992 começou a trabalhar para a Microsoft em projetos multimídia. Em 1995 começou a trabalhar com a Internet e em setembro de 1997 abriu seu estúdio, Roger Los Studio, em Seattle.
Holger Friese é alemão. Estudou fotografia, trabalhou para uma gravadora de jazz e estudou design gráfico de 1993 a 1997, em Aachen, Alemanha.
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