domingo, 17 de agosto de 2008

“DOIS A DOIS” DE SÓLON BARRETO: REINVINDICANDO A ALTERIDADE

Quais teriam sido os pensamentos e os vieses que permitiram ao ator e diretor de teatro, Sólon Barreto a consolidar num só quadro epistemológico o caos do ser contemporâneo: instabilidades emocionais, vaidades individuais consolidados e legitimados por questões sociais e morais numa perspectiva informal, “um papo comédia” no qual as relações e vaidades masculinas e femininas se acentuam definitivamente?
Ainda que no decorrer do “papo” o ator deixa vir à tona elementos do cotidiano, isto é, piadas e textos correntes na internet, ainda assim houve muita criatividade ao usá-los, de modo que a maioria da platéia deixou-se encantar pelo desempenho do ator, cuja expressão de palco é bastante significativa.
Além disso, é curioso perceber o potencial crítico do ator ao tratar de uma só vez, do pluralismo do dia-a-dia, violência doméstica, individualismos e, sobretudo, o quesito da alteridade, ou seja, ao se travestir nos personagens feminino-masculino reivindicava a alteridade da mulher contemporânea de um ponto de vista no qual se vê de uma forma crescente na platéia, a catarse feminina. Dizendo de outra forma, há em “D IS A D IS” a identificação insistente da presença da voz da mulher como um dos riscos mais assanhados da cultura pós-moderna. Embora fiquem evidências de que na tradição local quem vai predominar de fato é a voz do ideal de macho, isto é, o personagem Chico Navalha é o ponto nefrálgico do “papo”, porque há nele a possibilidade da maioria dos espectadores se identificarem, inclusive os homens tendem a seguir seus pontos de vistas e, as mulheres por sua vez, vêm nesse tipo dupla face da realidade local, pois uma pode estar representada na figura do pai ou do irmão homofóbicos e violentos.
No que se refere à natureza da apresentação é interessante observar como, apesar da experiência explícita do ator não houve interação com a técnica, uma vez que produção não estava atenta as ações do ator no palco, vindo a soltar a trilha sonora fora de tempo de cena. Outra questão intrigante em “D IS A D IS” é a presença de um Banner com foto de celebridades, visto que ator em momento algum fez uso efetivo daquele elemento cênico. (Será que tiveram a devida autorização para fazer o uso de tais imagens?)
A profundidade e a distância existentes entre homens e mulheres são de fato, uma questão importante, todavia o pensamento feminista marca todo o texto e exigiu do ator posicionamento de palco extremamente complexo, uma vez que a relação entre os sexos bem como todas as questões da sociedade contemporânea reivindicam sentidos, sejam, de forma sistemática, particularizada e ou localizada historicamente, opondo-se quaisquer perspectivas ontológicas de conciliação.
É ainda o caos humano que determina a ação do ator no palco. Porém o estilo proposto pela equipe ao invés de debater os assuntos subliminarmente jogados no texto, preferiram carnavalizá-los. Afirmando de outro modo, prefere-se o riso à problematização de temas importantes destacados por meio das personagens construídas ao longo da encenação.
Os sentidos carnavalizador e irônico da peça ficam evidenciados no “vocabulário praça da pública” onde as partes genitais tanto do homem quanto da mulher são ridicularizadas à medida que se coloca em destaque a questão do poder e da força advindas dessas partes (tamanho), sendo delegado ao homem todo faloegocentrismo permitido pela sociedade. Já à mulher lhe é permito apenas os devaneios em relação ao sexo.
Em “D IS A D IS” ficam evidentes tendências contemporâneas, o neorealismo no qual se usa vários elementos da cultura numa mesma perspectiva para denunciar fatos corriqueiros e, que por tanto, serão compreendidos como meras brincadeiras, pois não delimita nem o sujeito tampouco o objeto da ação.
Por fim, um dos efeitos mais importante desse trabalho é o questionamento da legitimidade dos sujeitos e lugares de fala cada um, considerados importantes para a reivindicação e manutenção da alteridade de ambos os sexos.

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